Publicou os livros A Questão da Andorinha (poemas, 2011), Corpo Oral (contos, 2013) e Leito Invisível (poemas, 2015).
Conversamos com o autor para descobrir mais sobre o processo criativo da escrita e entender como o cenário local pode dar suporte e abraçar a sua comunidade de escritores.
Quando você passou a assumir-se como escritor? Descreva como aconteceu esse processo.
É engraçado porque a escrita foi acontecendo. Eu sempre fui incentivado à leitura, sempre li muito, desde que me entendo por sujeito. Eu sempre estive com livros nas mãos, quer dizer, sempre com universos de ideias pulsando a cada nova descoberta. Penso que todos os leitores assíduos têm isso em comum, nós somos colecionadores de personagens, caçamos metáforas, queremos sempre a próxima cena a ser descrita, o próximo poema que fará com que todos os outros se pareçam inúteis. Então, quando você chega nesse estágio, há sempre um novo desejo que surge — o desejo de criar os próprios textos, de também manusear cuidadosamente as palavras.
Escrever, para mim, é uma batalha travada entre nós mesmos e nossas ideias, no sentido do texto ser sempre o resultado do que estava perfeito e completo na minha cabeça, e do que eu consegui expressar a partir do meu conjunto de termos, do meu vocabulário, da minha engenhosidade. Como eu dizia, desde que me conheço por “sujeito” eu já era um “sujeito leitor”, até que aos treze ou quatorze anos comecei a colocar ideias no papel — quase que diariamente. E foi acontecendo, às vezes com intervalos infinitos — seis, sete meses sem escrever nada. Outras, com fluxos mais intensos. É normal respeitar esses períodos de seca, da mesma maneira que é preciso dar tempo para que a escrita se torne essencial.
Você publicou dois livros solo de poesia e um de contos. O que atualmente você mais gosta de escrever? Por que?
Existe um processo criativo diferente para cada gênero que você escreve? Fale um pouco sobre a matéria prima do escritor, a palavra.
Acho que existem processos diferentes para sair de cada seca. O que fazemos como escritores é isso: vamos nos dando desafios. Buscando dentro do nosso repertório — que está sempre em construção e por isso cada processo se difere, porque vem carregado de novos textos, de novos métodos — a gente vai moldando as ideias, deixando os pensamentos mais refinados, vai conseguindo criar formas de editar o material na cabeça, o processo literário se torna algo natural, uma ferramenta do processo de pensar.
Eu nunca penso no gênero, penso no texto, qual o seu propósito. Até mesmo porque é muito comum eu testar diferentes formatos para um mesmo texto, expandindo e contraindo as ideias, brincando com a forma da leitura, até se desapegar do texto inteiro. Para mim, alguém se torna escritor quando consegue encarar essa tela em branco como um espaço de experimentação. Não me importa tanto o resultado final, mas que eu instaure constantemente espaços de escrita no meu cotidiano. Na prática, o escritor é aquele que escreve.
Suas fontes de inspiração mudaram muito nos últimos anos? Quais os campos onde ela germina para você colher a escrita?
Qual sua visão sobre o cenário literário brusquense?
Com a Internet, não existe mais esse campo local, os leitores estarão onde estiverem. Resumindo, acho que o cenário local é tímido e descompromissado, existe-se um repúdio a que aconteçam cenas porque o improviso não existe na cidade.Acredito que falta produção de verdade, aqui. Não acredito que seja falta de pessoas interessante e com ideias interessantes na cabeça, as novas pessoas que conheço vão me mostrando que pessoas interessantes existem aos montes. Mas se produz muito pouco, se socializa muito pouco essa informação. A escrita serve para isso, para que se forme uma corrente de leitores e ouvintes. Sem escrita e sem performance não há cena. Novamente, faltam zonas autônomas temporárias. É preciso que se perca o medo da contaminação poética.
A publicação de um livro é um divisor de águas para quem escreve? Ou é possível manter-se em produção sólida apenas engavetando textos e publicando de maneira informal?
Acredito ser possível, com certeza. Mas acho uma pena. Pensar um livro é treinar um outro estágio, diferente desse primeiro onde a escrita vem descompromissada. Lapidar um livro é pensar o texto como uma forma de contato. É divisor de águas porque faz com que o autor se torne responsável por produto cultural. Mas essa publicação pode ser online, por exemplo. Pode ser tanto um fanzine em PDF quanto uma coletânea de poemas impresso em capa dura com mais de duzentas páginas. Não importa o tamanho, importa é pensar nesse todo como algo que afetará pessoas. Que criará afetos mediante a palavra. É para isso que escrevemos, para criar laços — independente do tamanho das comunidades que queremos atingir, seja um grupo fechado de cinco amigos ou publicar em uma grande editora.
Recentemente você tem publicado textos sobre a Sociologia da Cultura e vem organizando e se apresentando em eventos de debates. Fale um pouco sobre essa produção paralela mais voltada para a área acadêmica.
A área acadêmica me encanta porque me permite sair da esfera da ficção e continuar escrevendo na esfera do real. Apesar de compreender que esse real também é uma narrativa proposta, a sociologia e a filosofia permitem que o escritor pense o campo social de formas mais imaginativas. Meus últimos textos no Zona Autônoma, bem como meus últimos artigos publicados, possuem essa característica de expandir a criatividade para se pensar o campo das relações sociais. E é no Café com Texto que tive o privilégio de encontrar mais pessoas, em Brusque, que querem debater o mundo. Saem boas reflexões desse grupo, me alimentam em outra área de interesse.
Já foi anunciado que seu novo livro de poemas, intitulado “Ficção, 3%”, será lançado no em 2019. O que você pode nos contar sobre ele?
Acredito perseguirem novos temas dentro da minha poesia. Estão impregnados de Foucault, Hakim Bey, de pensadores das áreas da sociologia, dos estudos identitários, da poesia e da arte ativista. Em “Questão da Andorinha” eu era um escritor que tinha descoberto micropoemas e queria testá-los no papel, como um livro que se manuseia. “Corpo Oral” — tanto o livro quanto a peça — se basearam em trajetos que eu fazia de ônibus e as pessoas que eu ouvia nesses caminhos, são furtos que fiz de outras bocas. O “Leito Invisível” é a tentativa de um livro monotemático, tenta rasgar a vida íntima de um casal de personagens. Agora, são textos mais esparsos. Propõem mais visões, toda reflexão é possível, é um novo processo de inspiração, possuem um novo objetivo dentro da poesia crítica.
Para finalizar, gostaríamos que você deixasse algumas considerações para os futuros escritores e todos aqueles que, de alguma forma, exercitam a escrita dentro da nossa comunidade.
Venham para o Incorporação da Escrita e experimentem novos processos. Vamos nos encontrar para escrever, para despertar novos textos, para movimentar de novo a cena. Exercitem a escrita, mas também os laços.
https://medium.com/@underlinestd/entrevista-rafael-zen-1b419aa95e6c
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