sexta-feira, 12 de junho de 2020

ENTREVISTA COM O ESCRITOR CATARINENSE CELESTINO SACHET

Celestino Sachet lança inventário da literatura catarinense de ficção

Pesquisa levou uma década para ser concluída e tem mais de 600 páginas na versão integral

25/10/2012




A Literatura dos Catarinenses - Espaços e Caminhos de uma Identidade, título da extensa pesquisa de Celestino Sachet, levou mais de uma década para ser concluída, contemplando prosa, poema e teatro de cerca de 1600 autores catarinenses. O estudo ganhou também uma versão reduzida, com ilustrações de Rodrigo de Haro.

Nascido em 1930, no município de Nova Veneza, sul de Santa Catarina, Celestino Sachet foi advogado e professor da Universidade Federal de Santa Catarina. Ao lado do irmão, Sérgio Sachet, comandou o programa de televisivo Santa Catarina: 100 Anos de História, exibido no final da década de 1990. Hoje, aos 82 anos, titular da cadeira número 15 da Academia Catarinense de Letras e com mais de 20 livros publicados, Sachet tem uma certeza: ainda há muito o que fazer.

Confira entrevista com o autor:

DC - Por que uma literatura dos catarinenses?

Celestino Sachet - Quando eu estava fazendo a pesquisa para o livro atual, nesses mais de dez anos, me dei conta de que muita gente, inclusive aqui em Santa Catarina, nega a existência de uma literatura catarinense. Ou seja, negam que tenha uma literatura, com uma marca específica, que se se diferencie ostensivamente das demais, de cada Estado. Eu, então, pensando mais a fundo, achei que, na realidade, quem escreve o livro aqui em Santa Catarina não é a cultura catarinense, mas o homem, o indivíduo. Então, quem é catarinense? Segundo o critério que todo mundo adota, é catarinense quem nasce em Santa Catarina, quem mora em Santa Catarina e também, eu diria, quem esteve em Santa Catarina e que, em determinado momento, foi catarinense. Ou seja, eu de certa forma me livrei do problema da literatura de Santa Catarina e da literatura catarinense, porque, quando eu digo "dos catarineses", nem Jesus Cristo pode negar que seja.

DC - Além do fato de serem catarinenses, há uma identidade possível entre esses textos e autores?

Sachet - Eu diria que há uma identidade em caminho, uma personalidade em caminho. Embora não se possa insistir, o fato é que um livro escrito aqui na região do Litoral, por um pescador, é bastante diferente, por exemplo, de um livro que recebi agora, ali de Orleans, sobre a imigração no século passado. O problema, agora, é daqui para o futuro descobrir o que há por trás dessa literatura que está sendo publicada, já que cada região do estado tem características próprias, pelo menos na questão do conteúdo do que é escrito. Então, eu diria que há alguma coisa em andamento, não se pode negar.

DC - Como foi organizada a pesquisa?

Sachet - Foram dez rápidos anos, durante os quais consultei as publicações das editoras, frequentei sebos e, claro, comprei muitos livros. Hoje estou praticamente dormindo no meio de livros. Também foi preciso coletar jornais e andar por cidades do interior de Santa Catarina. Eu gostaria de ter colocado todos os autores catarinenses nessa pesquisa, mas tenho consciência absoluta de que não consegui. Em geral, peguei os autores que têm no mínimo dois livros publicados. Como eu falo que é uma literatura dos indivíduos catarinenses, foi preciso dar uma pequena biografia de cada um. Então, foi dessa forma: localizar o autor, localizar o livro e fazer algumas observações rápidas sobre o livro.

DC - O que o manteve motivado durante mais de uma década?

Sachet - O meu namoro com a literatura e a minha paixão pelo livro. Sempre gostei muito de ler. Não tenho outro hobby, não jogo futebol, não tenho o hábito de ir à praia, embora até faça algumas caminhadas, mas meu prazer e minha convivência maior sempre foram com o livro. Até porque fui professor de literatura brasileira, então eu tinha a obrigação, para ensinar na universidade, de ter a informação a mais ampla possível.

DC - Quais os próximos planos?

Sachet - Estou finalizando a pesquisa sobre a literatura de não ficção. São ensaios de autores catarinenses sobre História, Economia, Filosofia, Direito etc. Devo ficar envolvido com isso até o final do próximo ano. Depois, então, estou pensando em reunir os textos que escrevi ao longo dessa vida. São análises literárias. Adoro ler e tirar conclusões sobre o que os outros escreveram, é o papel do crítico. Aliás, particularmente, não gosto do termo crítico. Prefiro a palavra analista. Crítico parece uma autoridade. Analista é descompromissado, eu faço uma análise, outro pode fazer uma diferente. Mas isso é um projeto para daqui quatro ou cinco anos...


https://www.nsctotal.com.br/noticias/celestino-sachet-lanca-inventario-da-literatura-catarinense-de-ficcao

ENTREVISTA COM O ESCRITOR CATARINENSE RAFAEL ZEN

Escritor, poeta, professor e sociólogo. Brusque/SC.




Atualmente, Rafael Zen atua em projetos paralelos que abrangem literatura, sociologia, debate e cultura. Nesse percurso, tem sido um dos nomes mais importantes na produção de atividades artísticas independentes na cidade.
É um dos co-fundadores do Coletivo Hiato, atua como professor no Centro Universitário de Brusque (UNIFEBE), organiza os encontros do grupo de estudos Café Com Texto e também é editor da coluna Zona Autônoma,
que vai ao ar todas as terças-feiras no site do jornal O Município.

Publicou os livros A Questão da Andorinha (poemas, 2011), Corpo Oral (contos, 2013) e Leito Invisível (poemas, 2015).

Conversamos com o autor para descobrir mais sobre o processo criativo da escrita e entender como o cenário local pode dar suporte e abraçar a sua comunidade de escritores.

Quando você passou a assumir-se como escritor? Descreva como aconteceu esse processo.

É engraçado porque a escrita foi acontecendo. Eu sempre fui incentivado à leitura, sempre li muito, desde que me entendo por sujeito. Eu sempre estive com livros nas mãos, quer dizer, sempre com universos de ideias pulsando a cada nova descoberta. Penso que todos os leitores assíduos têm isso em comum, nós somos colecionadores de personagens, caçamos metáforas, queremos sempre a próxima cena a ser descrita, o próximo poema que fará com que todos os outros se pareçam inúteis. Então, quando você chega nesse estágio, há sempre um novo desejo que surge — o desejo de criar os próprios textos, de também manusear cuidadosamente as palavras.

Escrever, para mim, é uma batalha travada entre nós mesmos e nossas ideias, no sentido do texto ser sempre o resultado do que estava perfeito e completo na minha cabeça, e do que eu consegui expressar a partir do meu conjunto de termos, do meu vocabulário, da minha engenhosidade. Como eu dizia, desde que me conheço por “sujeito” eu já era um “sujeito leitor”, até que aos treze ou quatorze anos comecei a colocar ideias no papel — quase que diariamente. E foi acontecendo, às vezes com intervalos infinitos — seis, sete meses sem escrever nada. Outras, com fluxos mais intensos. É normal respeitar esses períodos de seca, da mesma maneira que é preciso dar tempo para que a escrita se torne essencial.

Você publicou dois livros solo de poesia e um de contos. O que atualmente você mais gosta de escrever? Por que?

Recentemente mergulhei em pesquisas teóricas, até mesmo por organizar o Café com Texto e a coluna Zona Autônoma. Estava produzindo quase que exclusivamente textos sobre sociologia da cultura, mas eis que comecei a
ler João Cabral de Melo Neto, Wilson Torres Nanini, Adélia Prado, Angélica Freitas, Julio Cortázar… quase que me provando a impossibilidade desse vazio. Comecei a comprar e ler mais poesia, e acho que de tanto ler novos textos, conhecer novos repertórios, a escrita do poema foi acontecendo novamente. Um processo pode ser esse, se deixar contaminar por novas formas de produção, por novos modos de contar.

Existe um processo criativo diferente para cada gênero que você escreve? Fale um pouco sobre a matéria prima do escritor, a palavra.

Acho que existem processos diferentes para sair de cada seca. O que fazemos como escritores é isso: vamos nos dando desafios. Buscando dentro do nosso repertório — que está sempre em construção e por isso cada processo se difere, porque vem carregado de novos textos, de novos métodos — a gente vai moldando as ideias, deixando os pensamentos mais refinados, vai conseguindo criar formas de editar o material na cabeça, o processo literário se torna algo natural, uma ferramenta do processo de pensar.

Eu nunca penso no gênero, penso no texto, qual o seu propósito. Até mesmo porque é muito comum eu testar diferentes formatos para um mesmo texto, expandindo e contraindo as ideias, brincando com a forma da leitura, até se desapegar do texto inteiro. Para mim, alguém se torna escritor quando consegue encarar essa tela em branco como um espaço de experimentação. Não me importa tanto o resultado final, mas que eu instaure constantemente espaços de escrita no meu cotidiano. Na prática, o escritor é aquele que escreve.

Suas fontes de inspiração mudaram muito nos últimos anos? Quais os campos onde ela germina para você colher a escrita?

Todo escritor é um colecionador de referências. As fontes mudam porque as inspirações mudam. A cultura é um processo de acumulação e assimilação,
é quase como ir de um ponto a outro fazendo trinta paradas no meio desse caminho — muito similar ao que acontece online, por exemplo. Um filme cita um poema que resultado numa busca por um período literário que te faz assistir um curta que te apresenta uma nova palavra, uma nova fonte de busca. É impossível a literatura e a escrita não germinarem para todas as direções. Para escrever, não se pode ter preguiça de conhecer múltiplas expressões.

Qual sua visão sobre o cenário literário brusquense?

Com a Internet, não existe mais esse campo local, os leitores estarão onde estiverem. Resumindo, acho que o cenário local é tímido e descompromissado, existe-se um repúdio a que aconteçam cenas porque o improviso não existe na cidade.Acredito que falta produção de verdade, aqui. Não acredito que seja falta de pessoas interessante e com ideias interessantes na cabeça, as novas pessoas que conheço vão me mostrando que pessoas interessantes existem aos montes. Mas se produz muito pouco, se socializa muito pouco essa informação. A escrita serve para isso, para que se forme uma corrente de leitores e ouvintes. Sem escrita e sem performance não há cena. Novamente, faltam zonas autônomas temporárias. É preciso que se perca o medo da contaminação poética.

A publicação de um livro é um divisor de águas para quem escreve? Ou é possível manter-se em produção sólida apenas engavetando textos e publicando de maneira informal?

Acredito ser possível, com certeza. Mas acho uma pena. Pensar um livro é treinar um outro estágio, diferente desse primeiro onde a escrita vem descompromissada. Lapidar um livro é pensar o texto como uma forma de contato. É divisor de águas porque faz com que o autor se torne responsável por produto cultural. Mas essa publicação pode ser online, por exemplo. Pode ser tanto um fanzine em PDF quanto uma coletânea de poemas impresso em capa dura com mais de duzentas páginas. Não importa o tamanho, importa é pensar nesse todo como algo que afetará pessoas. Que criará afetos mediante a palavra. É para isso que escrevemos, para criar laços — independente do tamanho das comunidades que queremos atingir, seja um grupo fechado de cinco amigos ou publicar em uma grande editora.

Recentemente você tem publicado textos sobre a Sociologia da Cultura e vem organizando e se apresentando em eventos de debates. Fale um pouco sobre essa produção paralela mais voltada para a área acadêmica.

A área acadêmica me encanta porque me permite sair da esfera da ficção e continuar escrevendo na esfera do real. Apesar de compreender que esse real também é uma narrativa proposta, a sociologia e a filosofia permitem que o escritor pense o campo social de formas mais imaginativas. Meus últimos textos no Zona Autônoma, bem como meus últimos artigos publicados, possuem essa característica de expandir a criatividade para se pensar o campo das relações sociais. E é no Café com Texto que tive o privilégio de encontrar mais pessoas, em Brusque, que querem debater o mundo. Saem boas reflexões desse grupo, me alimentam em outra área de interesse.

Já foi anunciado que seu novo livro de poemas, intitulado “Ficção, 3%”, será lançado no em 2019. O que você pode nos contar sobre ele?

Acredito perseguirem novos temas dentro da minha poesia. Estão impregnados de Foucault, Hakim Bey, de pensadores das áreas da sociologia, dos estudos identitários, da poesia e da arte ativista. Em “Questão da Andorinha” eu era um escritor que tinha descoberto micropoemas e queria testá-los no papel, como um livro que se manuseia. “Corpo Oral” — tanto o livro quanto a peça — se basearam em trajetos que eu fazia de ônibus e as pessoas que eu ouvia nesses caminhos, são furtos que fiz de outras bocas. O “Leito Invisível” é a tentativa de um livro monotemático, tenta rasgar a vida íntima de um casal de personagens. Agora, são textos mais esparsos. Propõem mais visões, toda reflexão é possível, é um novo processo de inspiração, possuem um novo objetivo dentro da poesia crítica.

Para finalizar, gostaríamos que você deixasse algumas considerações para os futuros escritores e todos aqueles que, de alguma forma, exercitam a escrita dentro da nossa comunidade.

Venham para o Incorporação da Escrita e experimentem novos processos. Vamos nos encontrar para escrever, para despertar novos textos, para movimentar de novo a cena. Exercitem a escrita, mas também os laços.


https://medium.com/@underlinestd/entrevista-rafael-zen-1b419aa95e6c

CASA DA LITERATURA CATARINENSE

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