quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

ENTREVISTA COM PAULO FLORES

 PAULO FLORES

 

1) Na apresentação do seu blog, assim está escrito: “Flerta com as letras, brinca com as palavras e nas entrelinhas vai deixando sua marca”. O que ou qual o traço mais marcante que você deixa nas entrelinhas dos seus textos?

Paulo: Eu acho que um traço ou característica mais marcante é um pouco de rebeldia naquilo que eu escrevo, seja em um texto que fale de amor, comportamento, seja em um texto que fale sobre questões indígenas, racismos, questões sociais. Na maioria dos meus textos tem um pouco de rebeldia ali. Tem coisas que eu penso de fato e não são simplesmente retratos de uma personagem, retratos de uma situação que eu vi. Boa parte dos textos tem uma opinião minha e que e aproveito para extravasar. Então, o traço mais marcante é a rebeldia.

 

2) “Ao final de tudo meu legado terá sido poesia”. Você é o autor desta frase poética, mas será que a poesia é suficientemente forte e importante para ter valor como algo a se deixar como legado? A poesia não precisa de complementos?

Paulo: Boa pergunta... Ali eu estou falando sobre um desejo meu. Apesar da frase ser afirmativa – que meu legado terá sido poesia -, ali eu acho que é mais um desejo meu. Quando eu não estiver mais por aqui, que as pessoas continuem lendo aquilo que eu deixei, os textos que eu deixei. Os poemas que eu escrevi, os textos que eu escrevi sejam publicados, sejam reverberados, retransmitidos e que passem por gerações, fazendo sentido para as pessoas. Hoje eu me deparo com algumas publicações minhas, que pessoas que eu nem conheço estão replicando por aí. Eu não lancei um livro ainda, mas eu tenho poemas premiados e que foram publicados e que estão por aí, em alguns livros espalhados. Creio que em algum momento, algumas pessoas vão se deparar com coisas que eu escrevi e se isso fizer sentido para elas, já vai ter sido bacana. |E acho que a poesia, o poema pode ser suficientemente sim, não necessariamente teria que ter complemento. Eu vejo Paulo Leminsky, Mario Quintana, Mario Prata, entre outros. Leminsky, por exemplo, não está mais entre nós e a obra dele e as coisas que ele escreveu estão aí, replicadas, reverberando, fazendo sentido para muita gente, fazendo refletir e não tem complemento. É o poema, é a letra, pura e simples, cheia de ideia.

 

3) Você jogou futebol de salão, inclusive era um goleiro com muitas qualidades: arrojado, excelente reflexo, seguro, ágil... Quais destas qualidades de atleta, daquela época em que jogavas futebol de salão, que você tem como escritor e poeta?

Paulo: O futsal, o futebol de salão surgiu para mim, para atuar como goleiro, meio que de paraquedas, meio sem querer. Foi a convite de um amigo, para suprir uma carência, uma falta que o time tinha e eu fui para uma situação, meio que de emergência (RISOS), sem ter planejado e acabou acontecendo. Isso se assemelha com o que eu vivi na escrita. Eu escrevi um poema falando de adoção, que é um tema que eu sempre atuei, como causa, por ser filho por adoção. E em um momento eu quis homenagear meus pais e falar de adoção. E não sei porque eu encaminhei esse poema para um concurso de poesias e esse poema acabou premiado. Foi o primeiro que escrevi e teve um resultado muito legal e é um poema que quando eu publico ele, as pessoas gostam muito e dão um feedback muito positivo a respeito dele. E a partir dali eu tomei coragem para começar a publicar as coisas que eu ia escrevendo e fui experenciando isso, vivendo isso, vivendo um mundo novo. Fazendo um paralelo com o futebol de salão foi mais ou menos a mesma coisa, eu não estava preparado para aquilo, eu fui conhecendo, explorando, vivenciando e gostando. Isso foi na minha adolescência, essa experiência com o futebol de salão e trago até hoje grandes lembranças, fiz grandes amigos naquela época que são amigos até hoje. A poesia, o poema, a escrita me trouxeram novos amigos de um mundo totalmente diferente, em um mundo que era totalmente desconhecido para mim e que eu estou adorando viver. Estou curtindo bastante fazer parte.

 

4) O que é mais difícil, treinar futsal e encarar os adversários ou encontrar inspiração e tempo para escrever? Justifique.

Paulo: O futsal é mais difícil, porque é um esporte coletivo e ali eu era goleiro. Quem estava na quadra ali comigo, quem estava no banco de reserva, quem estava envolvido comigo dependia da minha atuação para ter êxito. Éramos uma equipe. No poema é mais tranquilo. Eu escrevo quando eu quero, eu escrevo quando aparece inspiração, eu não sou pressionado a me inspirar, não tenho prazo para entregar nada, não tenho compromisso com o resultado. Porque eu escrevo o que eu quero, sobre o que eu quero e na hora que que vem a inspiração. E no futsal não; a data do jogo está marcada e ninguém vai querer saber se você está inspirado ou não para jogar. Você vai ter que jogar naquele horário pré-determinado, vai ter que fazer uma boa atuação e se não fizer, você vai ser cobrado por isso.

 

5) Há uma frase que diz: “Avó cria memórias que o coração guarda para sempre”. Que memórias marcantes os seus avós criaram contigo ou para ti, que o teu coração guarda?

Paulo: Sobre os meus avós eu tenho muito gosto de falar, porque foram muitas as memórias. Eu tive a sorte de, durante muito tempo, poder conviver, até com a minha bisavó. Meu avô paterno faleceu muito cedo infelizmente, eu não o curti. Eu adoraria curtir, grande flamenguista, meu avô Paulo. Mas a avó Penha, lá do Rio, a memória que eu tenho dela são as nossas conversas sobre espiritualidade. Eu era criança na época e ela com muita habilidade me esclarecia, tirava minhas dúvidas com muita paciência, com muita amorosidade. Minha avó materna, minha avó Valda faleceu faz pouco tempo, mas foi uma segunda mãe para mim. A casa dela aqui em Floripa foi o meu segundo lar. Eu passei muitas férias ali na casa dela brincando, os vizinhos até hoje me conhecem, me chamam por Paulinho, meu apelido na vizinhança. A comida da minha avó, as comidas dela, as brincadeiras dela, tudo isso são memórias muito vivas. E o meu avô, que era um “vozão”, aquele cara que você falava que estava com desejo de comer uma rosca de polvilho, podia ter certeza que em um ou dois dias ia aparecer uma rosca de polvilho, porque ele não sabia o que fazer para agradar. Meu avô me levava no desfile de sete de setembro, a gente saía para passear no centro, comprar tainha no mercado, comprar churros... Ele sabia as coisas que a gente gostava e trazia... As tardes na casa da minha avó, com o meu avô assistindo futebol, a gente debatendo futebol, falando sobre o Flamengo; ele cuidando dos passarinhos dele, ele fazendo caixa de madeira com divisória para eu guardar meus jogadores de futebol de botão. Nossa! Inúmeras memórias. Meus avós foram sensacionais para mim. Graças a Deus eu tive a permissão e a alegria de poder conviver e compartilhar de muitas coisas boas.

 

6) Qual é o seu poema mais antigo, que você escreveu e que guardou até os dias de hoje? Pode nos repassar?

Paulo: Meu primeiro poema, o mais remoto é O Caminho das Flores, de fato o primeiro poema, que foi uma homenagem que eu prestei aos meus pais adotivos e que eu acabei encaminhando ele para o concurso nacional dos novos poetas e ele foi premiado e publicado. É um poema que eu guardo com muito carinho. E a partir daí que as coisas começaram a acontecer

 

7) “Das gavetas da vida, algumas não abro mais, outras até remexo, há as que esqueço”... esse é um trecho de um poema seu. Quais as gavetas que você faz questão de esquecer, de não abrir mais e porquê?

Paulo: Pode parecer estranho, mas tem coisas que eu gostaria de não reviver, mas esquecer eu não consigo. E lembrar dessas coisas nos dá o norte para não repeti-las e não aceitar que elas aconteçam novamente. Não dá para esquecer, mas dá para não repetir ou não permitir que elas aconteçam. Só o fato da gente pensar nisso nos faz lembrar, então não tem como esquecer. Mas eu posso citar as situações de racismo que eu passei na minha infância, preconceito. São coisas que eu gostaria de não reviver, mas não tem como esquecer. E são coisas atuais, que a gente carrega ao longo dos anos e são fatos tristes. Esquecer não dá, pelo contrário, a gente acaba lembrando e lutando contra e fazendo um movimento diferente, não aceitando mais coisas que a gente aceitava.

 

8) Você é pai de um garoto, de nome Artur. Você escreveu o poema O Grande Encontro – o relato feliz sobre meu filho, descrevendo um pouco da relação dele com a leitura. Você o estimula a ler de que forma?

Paulo: Meu filho... eu estimulo muito ele com a leitura. Ele tem oito anos agora, ele lê, ele lê muito bem. Lê gibi, lê história, lê livros sobre tubarões, sobre bichos – ele adora. Antes de acontecer a pandemia a gente frequentava muito os sebos que tem ali na região do centro antigo de Floripa, Fernando Machado, João Pinto. Ali tem muitos sebos, tinham, eu soube que alguns fecharam. A gente se divertia. Eu ia para um lado, ele ia para outro. A gente tinha um acordo de, a cada ida lá, trazer revistinhas, gibis que ele adora, mas em contra partida, trazer um livro também. E assim a gente vai lendo, contando as histórias para ele, fazendo a imaginação dele viajar e cultivando o hábito da leitura.

 

9) O seu filho além de te inspirar, te dá opiniões sobre seus textos, ou ele desconhece ou não compreende aquilo que você escreve?

Paulo: O Artur sabe que eu escrevo mas ele ainda não tem entendimento sobre o que eu escrevo; mas ele sabe. Tanto que, no dia dos pais ele me deu dois presentes, mas o que eu mais gostei foi um poema. Ele escreveu um poema para mim (RISOS). Eu fiquei feliz da vida, um poema com um desenho que eu guardo e em breve vai virar um quadro.

 

10) Millôr Fernandes disse: “Criança é esse ser infeliz que os pais põem para dormir quando ainda está cheio de animação e arrancam da cama quando ainda está estremunhado de sono”. Você age assim também com o seu filho ou você é um pai mais flexível?

Paulo: O Artur foi condicionado desde cedo, a dormir cedo, Geralmente oito horas, oito e meia ele já está dormindo. Eu e a mãe dele julgamos que isso seria bom e acostumamos assim. Ele tem, geralmente, onze, doze horas de sono, pelo menos dez horas de sono; ele dorme muito bem. Ele não troca o dia pela noite, o sono dele é no horário noturno, de fato. Ele acorda cedo, faz a refeição cedo, É uma criança saudável, é uma criança que se alimenta muito bem e está sendo legal, foi uma boa escolha. Depois a gente sabe que não vai ter muita ingerência sobre isso, mas enquanto a gente puder doutrinando ele desta maneira, a gente vai continuar. Ele já está com oito anos nessa rotina de dormir bem.

 

11) A sua escrita é de fácil compreensão ou você gosta de usar metáforas, duplo sentido, “pegadinhas”?

Paulo: A minha escrita é de fácil compreensão, sim; na maioria das vezes, na grande maioria das vezes. Ela tem uma linguagem direta, creio que ela é de fácil entendimento, a ponto de numa academia (literária) que eu fazia parte, ela era chamada de vira lata. Por não ter aquele linguajar antigo, rebuscado, que alguns dos escritores se utilizam. A minha é mais direta e ela foi chamada de vira lata lá. Mas a devolutiva que eu tenho das pessoas que leem os textos são muito boas, elas compreendem. Metáforas, às vezes eu utilizo sim, as pegadinhas... Eu costumo dizer que o barato do escritor é a inquietude do leitor. Do mesmo texto escritor podem interpretar de diversas formas, de acordo com o que ele está sentindo ou vivendo. Isso é um barato, isso é bacana!

 

12) Francis Bacon afirmou: “A leitura traz ao homem plenitude; o discurso, segurança; e a escrita, precisão”. Comente esta afirmação...

Paulo: Para mim essa afirmação faz todo sentido. Eu sempre li muito, eu sempre gostei muito de ler. A faculdade na qual eu me formei foi direito, então, é uma academia que você tem que ler muito e isso se refletia na minha retórica, no meu discurso, na minha forma de me portar e conversar com as pessoas, na busca por um vocabulário e uma boa escrita. Então para mim, faz muito sentido esta afirmação.  Tanto faz sentido que neste viés, eu educo o Artur dessa maneira com muita leitura.

 

13) Eis um trecho do seu poema Preto no Branco: “Beijo quente e amasso / Movimento e compasso / Equilíbrio suave / Entre o carinho e o devasso”. Você pode detalhar ou aprofundar um pouco, estes versos? Por exemplo, como pode haver um equilíbrio entre o carinho e o devasso?

Paulo: Preto no Branco é um poema interessante, legal que você tenha “puxado” ele e feito esta pergunta. Quando eu escrevi ele, eu imaginei a situação de dois amantes, numa situação de entrega, onde você tem um amor, nessa entrega, nessa troca, e tem a coisa devassa da sacanagem ali na hora do sexo, alternando momentos de carinho e leveza com momentos tórridos, quentes, de uma pegada mais firme, de uma palavra mais ousada. Aquela coisa de dar o tesão na hora e depois do gozo da catarse, se abraçarem, trocarem carinho, depois de ter vividos, instantes atrás, essa devassidão, esse suor pelo corpo.

 

14) Você costuma ler? Que tipo de leitura ou qual autor ou autora que te agrada?

Paulo: Eu leio bastante, eu tenho sempre um livro a mão. Ultimamente eu tenho gostado de ler biografias e autobiografias, principalmente a de astros do rock. Estou terminando de ler a do Marky Ramone, que conta a história dos Ramones. Tem um livro na fila, para começar a ler, do David Grohl, do Foo Fighters. Eu li a do Keith Richards, dos Rolling Stones – é uma autobiografia. Eu li a do Bruce Springteen, é sensacional. E são livros que tomam tempo, porque são livros grossos que contam em detalhes a vida desses caras, a história deles no rock, com as bandas e isso me fascina. Mas eu gosto também do Billy Reyes, que escreveu O Expresso da Meia Noite. Gosto muito dos livros baseados em fatos reais. De autores nacionais eu gosto do Mário Quintana – bastante; do Paulo Leminski – curitibano Paulo Leminski, do Mário Prata, Ariano Suassuna. Tem uma turma muito boa escrevendo. Eu estou fascinado. Se eu pudesse ganhar a vida lendo livro seria sensacional, mas não dá. Mas (ler) é bom demais. É um vício que eu peguei.

 

15) Você carioca e mora há anos em Florianópolis. Estas duas cidades possuem belezas naturais que inspiram músicos, compositores escritores, poetas, enfim, artistas de diversos segmentos. É daí que vêm a sua inspiração ou é somente uma coincidência?

Paulo: Rio de Janeiro e Florianópolis são duas cidades sensacionais. Floripa é quase que uma mini Rio de Janeiro. São duas cidades que eu amo, não gosto que falem mal de nenhuma das duas. Com cenários maravilhosos, mas por incrível que pareça, paisagem e cenário não é o que me inspira. Às vezes, eu gosto de estar neles para escrever, mas não que isso seja a inspiração, de ver uma praia, uma imagem, uma montanha. O que me inspira é música. A música me inspira muito, não importa onde eu esteja. Se eu estiver sentado em uma bela praia escutando uma musiquinha, vai me inspirar pela música, não pela praia. Até escrevi um poema sobre isso, sobre o que me inspira e para mim é a música.

 

16) Você mora na Lagoa da Conceição, em Florianópolis. Qual a mágica, ou a magia que este lugar tem que mais te fascina, encanta e inspira? E por quê?

Paulo: A Lagoa da Conceição é um lugar fascinante, é um local onde tem cultura – cultura popular. É um local onde você vê o artesão, as artesãs, onde você vê a turma das antigas, os oleiros, as rendeiras, onde você vê o feirante. Onde você conversa com todas estas pessoas e você troca excelentes ideias. Você vê músicos pela lagoa, você vê músicos de fora, chilenos e peruanos, desfilando a arte deles na Lagoa. Todo mundo vendendo sua arte, divulgando sua arte, nesse lugar tão sensacional, de tão bonito que é. Isso tudo inspira; estar na Lagoa inspira. Não que olhando a lagoa me cause inspiração, não. Morar na Lagoa, estar situado na Lagoa eu acho sensacional. Parece que você quando sobe o morro da Lagoa, lá em cima, quando você está naquela vista linda e começa a descer, parece que ali tem um portal que te leva para um canto da cidade que é especial. Tenho muito carinho por este canto, moro aqui e gosto muito dessa região: Lagoa, Rio Tavares, Campeche. Se eu puder escolher, optar, eu não saio dessa região.

 

17) Existe alguma coisa ou aspecto na poesia que você não goste ou que te incomode?

Paulo:

 

18) Na sua página de Facebook, tem fotos suas praticando corrida. Correr é uma atividade que, muitas vezes, dá a sensação de liberdade. Como você se sente mais livre: correndo ou escrevendo poemas?

Paulo: Eu me sinto mais livre correndo. São tipos de liberdades diferentes. Eu gosto muito de correr em trilha e na trilha eu sinto o cheiro do mato, tem trilha que eu faço e fica na beira do mar, tem a maresia junto. Isso me dá uma sensação de liberdade muito grande, o vento na cara.... O vento na cara é uma coisa que eu gosto demais, assim como eu sinto quando ando de moto. Quando me falas liberdade entre essas duas opções, eu acho que a corrida me dá mais essa liberdade, porque é uma sensação que vem naturalmente. É começar a correr e vem o ventinho e se sentir livre.

 

19) Vamos falar sobre livros: o que falta para que você publique o seu primeiro livro?

Paulo: Para eu publicar o livro, faltam algumas coisas. Falta eu encontrar a editora, gráfica. A produção vi ser independente, então falta verba. E acho que eu vou tentar um financiamento coletivo, tentar não, realizar. Criar um projeto para realizar um financiamento coletivo para viabilizar a publicação desse livro. Estava meio morno e agora eu estou com uma vontade tremenda de concluir isso e lançar meu primeiro livro. Eu quero fazer isso com muito cuidado, com muito carinho nessa primeira publicação. Eu olho amigos que publicaram, acho um grande barato ter uma obra constituída. Pois o livro, além da tua expressão que está exposta ali, são palavras que não voltam mais e ficam aí, para que todo mundo veja, para que todo mundo perceba tuas intensões, percebam teu pensamento e isso fica para o mundo e não volta mais.

 

20) Tens alguma meta como escritor, seja em remuneração, prêmios a conquistar, reconhecimento da mídia, dos leitores?

Paulo: Minha meta como escritor é seguir como escritor, lançar o primeiro livro e continuar tendo inspiração para lançar o segundo, o terceiro... e não só de poemas, mas entrando na parte de narrativas. Fazer disso não só um hobby, mas uma forma de rentabilizar. Não tenho o objetivo de ficar rico, nem nada disso. Mas, dos livros, dos produtos que eu penso em produzir com os escritos, eu penso em ser sim, uma maneira de um complemento de sustento. Eu tenho a ideia de fazer uma Kombi literária e levar a leitura, espalhar a leitura por aí. Agora, reconhecimento de mídia, esse tipo de coisa, não. Não tenho isso; isso é uma coisa que pode vir naturalmente, mas eu quero que muitas pessoas leiam o que eu escrevo. Que aquilo que eu escrevo se espalhe por aí e que faça sentido para as pessoas. Que as pessoas leiam aquilo e que possa tocá-las de alguma maneira, como já me apontaram, que determinados textos tocam, servem de incentivo e de reflexão. Esse é o meu barato.

 

21) O que te faz escrever é um sentimento de angústia, dor, mágoa, ou de alegria, felicidade, euforia, gratidão?

Paulo: O que me faz escrever depende do momento; tem momento de mágoa, de extrema felicidade, euforia, gratidão, é um misto, depende muito do momento. Já houve situação em que eu quis me expressar sobre determinado assunto, algum assunto polêmico que tenha me causado raiva, mas que naquele momento me faltou a palavra certa e não me saiu nada. Porque eu venho de inspiração e tem momento de euforia, que bateu uma música, uma inspiração que em cinco minutos já estava pronto o meu poema. Mas o motivo em si, posso falar que não há nada muito específico. É muito do momento e pode ter sim, alegria, euforia, tristeza, angústia, enfim, cada um dos itens citados na pergunta.

 

22) Complete esta afirmação: escrever faz bem porque...

Paulo: Escrever faz bem porque faz com que eu expresse o que eu penso, na hora que eu penso, do jeito que eu penso e de uma maneira que ninguém pode me conter. Eu escrevo o que eu quero e sou responsável pelo o que eu escrevo, publico a hora que eu quero, jogo para o mundo a hora que eu quero. E essa sensação de liberdade, assim como a da corrida (RISOS), me faz muito bem. É libertador escrever!

 

23) Você é mais apaixonado pelo Flamengo ou pela poesia?

Paulo: O Flamengo está no meu DNA; está no meu sangue, corre nas minhas veias. E a poesia eu fui desenvolvendo depois de grande, é uma coisa mais recente e que me apaixonei. Hoje é uma paixão também. O Flamengo é uma poesia. Se você tirar o Flamengo só do futebol, ele é uma poesia. Basta ir ao Maracanã para ver a sinergia da torcida chegando no estádio, subindo a rampa, os cantos, as bandeiras das torcidas chegando, o ritual antes do time entrar em campo, o frisson, a batucada da torcida descendo a rampa no final do jogo, a multidão indo pegar o metrô, o trem, o ambulante vendendo a sua cerveja, vendendo as faixas, seus produtos, a alegria do torcedor, o sem dente junto do mais abastado... isso tudo é poesia! O Flamengo é uma grande poesia. Observar o Flamengo em um domingo no Maracanã é uma grande poesia. E entre p Flamengo e a poesia, se eu tiver que comparar, o Flamengo dá uma goleada (RISOS).



PAULO FLORES





Paulo é natural do Rio de Janeiro e ainda garoto foi morar em Florianópolis - SC. É formado e Pós Graduado em Direito , pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. Nesse período, teve seu primeiro contato com o mundo dos poemas através do poeta Emmanuel Marinho. Apesar da formação jurídica, seguiu carreira profissional na área comercial, sobretudo no universo da tecnologia. Em 2017, escreveu seu primeiro poema - "Caminho das Flores" - no qual retrata sua trajetória de início de vida e homenageia seus pais. Poema este, premiado no CNPP - Concurso Nacional dos Novos Poetas de 2017. Desde então, segue escrevendo e espera em lançar seu primeiro livro


terça-feira, 8 de dezembro de 2020

ENTREVISTA COM CLÁUDIA KALAFATÁS

CLÁUDIA KALAFATÁS


 1.        Conte um pouco de cada um dos livros que você publicou...

Cláudia: Meu primeiro livro, chamado Dilemas, Reticência – Poemas, eu publiquei em 2015, se não me engano. Quando eu mandei o material para a revisão e para a gráfica, ainda tinha sobrado material para quase que um segundo livro. Ele veio em um momento em que eu achei que tinha uma doença grave e achei que, talvez, não me restasse muito tempo de vida. E pensando nas coisas que já fiz, que coisa faltaria fazer, antes de eu desencarnar, eu pensei nos meus poemas. Essa foi a mola propulsora. Graças à Deus o diagnóstico de câncer na coluna, pelo jeito (RISOS) foi só para que a clínica que fez o laudo do exame, não fosse posteriormente acusada de não ter sequer suspeitado que poderia haver um câncer de coluna. No final, pelo jeito, foi uma grande hérnia extrusa entre a L4 e a L5 e o câncer não se configurou. O segundo livro nasceu pelo feedback que eu recebi do primeiro livro. O primeiro livro eu não me preocupei com capa, com página de dedicatória, com nada. Não me preocupei em pedir para alguém fazer uma crônica, colocar uma opinião no prefácio, então todos estes cuidados eu tive no segundo livro chamado Harpa Inerte. Com todas as poesias que não couberam no primeiro livro. E no segundo livro eu me preocupo mais com rima, com estrutura dos poemas... É claro que também houveram poemas que eu escrevi durante a concepção do segundo livro. Mas eu posso arriscar que sessenta por cento do livro era dos manuscritos, dos rabiscos, fragmentos de poesia, que datam desde os meus dezoito, dezenove anos de idade, então eu tinha muita coisa para poder lançar o segundo. O segundo livro, se não me engano, eu lancei em novembro de 2018. E muito embora meu terceiro livro não tenha sido publicado ainda, oitenta por cento dele já está no computador. Ele vai se chamar A Sala. E nesse livro eu me preocupo mais ainda com a métrica.

 

2. As publicações foi você quem pagou ou foi com alguma editora?

Cláudia: A primeira e a segunda fui em quem pagou e pelo jeito, a terceira também vai ser.


3. Seus livros vendem bem?

Cláudia: Os meus livros vendem bem no lançamento, na noite de autógrafos, depois não vendem bem. Depois a gente tem que ir atrás de feira de artesanato... Agora eu vou deixar vinte exemplares do Harpa Inerte em um bazar de natal, no Ribeirão da Ilha.

 

4. Onde seus livros podem ser encontrados?

Cláudia: O livro Dilemas, Reticências – Poemas, até um tempo atrás, eu tinha deixado cinco exemplares na Livraria Catarinense. O livro Harpa Inerte eu não me movimentei muito, porque eu o lancei no final de 2018 e 2019 foi um ano muito conturbado para mim e, 2020 eu não preciso falar nada (RISOS). Em relação à poesia eu não fui muito proativa em relação ao meu trabalho.

 

5. Qual a pior parte: escrever, publicar ou vender?

Cláudia: Escrever sempre é a melhor parte de qualquer produção literária. Publicar dá um certo “trabalhinho” porque, na minha segunda obra eu tive que mudar palavras por causa de concordância e essas palavras eram importantes. Eu queria fazer um jogo, uma brincadeira com as palavras, porém não era correto eu utilizar daquela forma. Eu não gostei, me senti aprisionada até onde as regras gramaticais da língua portuguesa podem interferir ou não. Nesse meu terceiro livro eu vou utilizar a licença poética e não vou aceitar esse tipo de interferência no que eu escrevo. Mas mesmo assim, publicar não foi ruim. Sem dúvida alguma, vender é sempre a atividade mais desafiadora, complexa e ainda misteriosa.

 

6. As palavras a seguir foram retiradas de um livro seu: “o tempo esclarece dúvidas, mas questiona minhas certezas”. Quais as dúvidas que você tem e que o tempo ainda não esclareceu e que ainda te incomodam?

Cláudia: Esse trecho, quando eu o concebi, representa o quanto oscilam as nossas dúvidas. O que hoje, o que para mim é uma dúvida, amanhã com a minha experiência, com a minha vivência, ou com um simples insight com as coisas que acontecem ao meu redor, eu tenho essas dúvidas esclarecidas. Quanto mais a gente domina um assunto, quanto mais a gente mergulha na vida, nas emoções, quanto mais a gente amadurece, nos seus mais diversos papéis, a Cláudia companheira, a Cláudia mulher, a Cláudia amiga, a Cláudia irmã, a Cláudia filha, a Cláudia profissional, quanto mais a gente evolui em cada um desses papéis, mais surgem questões. Talvez a minha alma seja mais inquisidora mesmo, seja mais de ficar questionando as coisas. Por isso que o tempo também questiona as minhas certezas. O que hoje é uma certeza para mim, em função da minha experiência, amanhã com uma outra experiência eu posso me enveredar por um outro caminho. Porque aquela experiência que me serviu ontem para que eu tivesse algum tipo de conceito, hoje a experiência é outra e está me afetando de uma outra forma, então eu posso mudar. Um dúvida que o tempo ainda não esclareceu e que ainda me incomoda é como é complexo um relacionamento entre as pessoas. Seja de ordem afetiva, seja de ordem profissional, de ordem familiar; e nesse período de pandemia, nesse período de guerras de narrativas, no que se refere ao nosso cenário político, isso está cada vez mais sensível. Para mim, sem dúvida, essa é a pergunta que ainda me incomoda muito.


7. Você tem algum ritual de preparação para escrever?

Cláudia: Eu tenho vários rituais para escrever, tenho uns pré-requisitos. O primeiro é o silêncio; se eu não tiver silêncio, pode, no máximo, estar tocando uma musiquinha calma. De preferência um Madredeus, Enya, pode ser Sara Mc Lachlan, enfim, músicas para interiorização; nada de músicas de baladas para fazer faxina, isso não funciona. Fora isso, eu tenho percebido que quando eu tomo uma cerveja ou um vinho, esse estado que a gente fica, que é um estado de leveza, um estado em que a tua observação fica mais aguçada, os teus sentidos também ficam mais aguçados, isso ajuda bastante. Às vezes, assistir um filme que tem uma mensagem bonita, daquelas que te tocam profundamente no âmago, isso é um start, um pontapé inicial para eu criar uma frase e com base nessa frase e no filme que assisti e naquilo que ele deixou em mim, latejando, e ali eu posso conseguir um bom resultado de escrita. Acho que para mim o pior pré-requisito é quando a gente está passando por um momento de dor – dor afetiva, dor emocional, dor na alma, Eu descobri também que essa é uma forma de eu trabalhar esta tristeza é através da escrita. Mas, infelizmente, essa é aquela de custo-benefício pior para mim. De qualquer forma, acho que é uma maneira válida da gente trabalhar o que está doendo dentro da gente, colocando no papel.


8. Você tem alguma meta de escrita, seja diária, semanal, ou escreve quando “bate” a inspiração?

Cláudia: Não. Não tenho. John Steinbeck é que tinha; eu li a biografia dele e ele tinha meta diária. Eu não sou disciplinada, eu prezo pela qualidade daquilo que eu estou escrevendo e não pela quantidade de letas e palavras, enfim... Às vezes eu fico meses sem escrever uma linha e aí em uma madrugada eu escrevo cinco, sete poemas; inacabados, sempre! É raro escrever um poema que se fecha por si só, no momento da inspiração. Mas tem momento em que muito material chega.

 

9. Quando você tem uma ideia, você a deixa incubando ou escreve imediatamente?

Cláudia: Às vezes eu deixo a ideia matutando na cabeça, para eu extrair dessa ideia uma frase, que seja o título ou o coração do poema. Então eu fico remoendo aquela ideia até que ela se materialize e eu possa escrever. E às vezes, dependendo do lugar que eu estou, se eu estou em um local que eu não consiga escrever, aí eu baixo imediatamente a ideia crua, a ideia que será fonte de inspiração. Tem momento para cada uma das duas situações.

 

10. Você escreve seus rascunhos à mão ou no computador? Justifique sua resposta...

Cláudia: Sempre escrevi meus rascunhos à mão; sempre. Na minha bolsa, até no porta luvas do meu carro, tem sempre um caderno pequeninho, no estilo moleskine; e caneta eu sempre carrego na bolsa. A digitação é para quando eu vou colocar esses poemas no livro, no arquivo do livro. Sempre escrevo o rascunho à mão.

 

11. De acordo com Fernando Pessoa: “Boa é a vida, mas melhor é o vinho. O amor é bom, mas é melhor o sono.” E para você, qual é a ordem de importância entre a vida, o vinho, o amor e o sono? Justifique...

Cláudia: Eu coloco na ordem: a vida, o amor, o sono e por último, o vinho. A vida porque sem ela não tem como amar. O amor, para mim é o chão, é a sustentação de cada um de nós enquanto seres que se relacionam com outros seres, sejam seres humanos, natureza, sejam os animais, seja a espiritualidade, enfim... Então o amor é peça fundamental da nossa existência. Sono, porque o sono restaura tudo: o sono restaura um dia ruim, o sono restaura um rompimento afetivo, o sono restaura o corpo físico, o sono restaura as dores da alma, o sono é tudo de bom. E o vinho porque ele tempera a vida, tempera o amor, embala o sono... Nossa!  Falar sobre o vinho daria, no mínimo, uma poesia

 

12. O que você diria a si mesmo se pudesse voltar aos seus primeiros escritos?

Cláudia: (RISOS) Em momentos intempestivos, não jogue nada fora (RISOS). Eu joguei algumas coisas fora do que eu escrevi. Hoje, talvez, eu tivesse maturidade para retrabalhar uma coisa que eu criei há trinta anos atrás. Acho que era isso que eu diria para mim.

 

13. Na tua apresentação, você afirma que a música colabora com a tua inspiração. Onde é possível perceber a influência de Guilherme Arantes, RPM, Zizi Possi, Simone e de outros artistas, na tua poesia?

Cláudia: Guilherme Arantes cantou muito o amor nas suas diversas manifestações, Guilherme Arantes colocou amor na melodia das suas músicas. Zizi Possi também, Simone também. RPM, naquela música em particular... (Cláudia começa a cantarolar): “Havia um tempo em que eu vivia um sentimento quase infantil”... Não me lembro agora o nome da música, mas era uma música que me aquietava muito, para que eu me interiorizasse e pudesse falar de amor. O amor permeia a grande maioria das minhas escritas, então é nesse sentido. Como eu respondi anteriormente, a música ajuda muito a me interiorizar e chegar nesse estado de leveza, para que eu possa escrever. Explicitamente, nenhum deles estão nas minhas palavras, mas sem dúvida eles foram pano de fundo, mas eles tiveram o papel de conduzir a minha mente para um estado amoroso, afetivo e talvez até, passional. E uma vez nesse estado, muita coisa foi escrita aos embalos das melodias deles.

 

14. Rubem Alves disse em uma entrevista que: “leitura é algo que se deve fazer por prazer, de forma vagabunda, sem nenhuma obrigação”. E a escrita, também deve ser feita desta forma? Justifique....

Cláudia: Esta pergunta é um tanto quanto intrigante. Os jornalistas são obrigados a escrever, eles tem editoriais em jornais, em sites, então eles são obrigados a fazer, a produzir escrita. A minha escrita, ela sempre foi feita de forma prazerosa, sem nenhuma obrigação, de forma vagabunda (RISOS) – eu não gosto do adjetivo vagabunda, então eu vou deixar este trecho, para o Rubem Alves depois se explicar... Eu acho que o processo de escrita tem que ser prazeroso, tem que ser leve, a gente não pode receber nenhum tipo de pressão.

 

15. Você acredita que os jovens, atualmente, estão lendo muito, pouco ou quase nada?

Cláudia: Eu precisaria ter dados para poder afirmar, não gosto de “chutômetro” e eu não tenho filho; tenho um afilhado que está com quatorze anos. Do pouco que eu tenho observado, eu acho que eles estão lendo muito pouco, mas muito pouco mesmo – o que é uma pena. Mas como eu te disse, eu não tenho fundamentação, eu não tenho pesquisa, eu não tenho nada. É só um certo senso de observação, em relação aquilo que está ao meu redor.

 

16. Você quando era adolescente, lia muito?

Cláudia: Quando eu era adolescente eu lia o suficiente para passar de ano. A partir do livro do Visconde de Tanay – Inocência, e de um outro – Cinco Minutos, do José de Alencar, que eu gostei muito de ler. Eu comecei a ler medianamente, mas nada se compara a partir dos meus vinte e cinco, trinta anos de idade, quando eu comecei a ler bastante.

 

17. “Escrevo na urgente necessidade de compartilhar o que sinto, escrevo minhas verdades, meias verdades, minto”. Essas são palavras suas retiradas do livro Dilemas, Reticências: Poemas”, de sua autoria. Você escreve mais mentiras, verdades ou meia-verdades?

Cláudia: Eu escrevo muito mais verdades e meias verdades. Já aconteceu de eu ter que mentir numa situação para achar uma palavra que rimasse (RISOS), é um absurdo isso. Mas hoje eu tiro isso como uma licença poética. Eu já menti, mas graças a Deus, isso não é nem três por cento do que eu escrevo. Todos os meus livros são autobiográficos. As meia verdades eu colocaria como aquelas situações confusas que eu precisei resolver internamente, mas que eu nunca tive certeza se procederam desta forma para outra pessoa, ou não; são só inferências minhas. Graças a Deus, a mentira eu precisei usar para rimar, vê se pode... (RISOS). Tem poema que a narrativa é de um homem e não de uma mulher, então isso não deixa de ser uma mentira. Tem mais do que um poema em que eu tive que incorporar um narrador masculino, mas é que dessa forma eu tinha riqueza nas rimas, na história. Foi dessa forma que eu consegui as minhas rimas, então esse é um tipo de mentira. Hoje eu colocaria como uma licença poética e não como uma mentira, porque se o imaginário não tem limites, então porque que o autor tem que ser mulher, porque que ele não pode ser um homem. Por que que a gente não pode vestir a ótica do outro gênero? Qualquer tentativa, qualquer troca, qualquer experiência na hora de produzir poesia, que possa chegar em um resultado bacana eu acho que é válida.

 

18. É possível escrever bem, sem que a pessoa leia muito? Justifique...

Cláudia: Eu acho que sim. Ela pode escrever muito bem, se ler muito. Mas isso no âmbito da poesia, por exemplo. Eu não leio muita poesia, porque se é que eu tenho algum estilo de escrita, ele é meu. Quando se lê muito, outros autores, você acaba absorvendo o estilo dele, porque gostou; a métrica da poesia porque achou bacana, divertida e quer fazer isso também... Então a gente recebe influência e acaba replicando as influências no nosso trabalho. Eu já não gosto... Eu gosto de... sei lá, eu gosto de explorar as diversas formas de criação e a partir disso, tentar estabelecer um estilo de escrita que seja meu. Acho que eu ainda não tenho um estilo de escrita, porque a minha preocupação é escrever e de vez em quando, brincar com as palavras, com o formato... A poesia Quarenta e Dois S, do meu primeiro livro, ela foi assim: eu acordei um dia, tinha uma grande amiga minha que estava fazendo quarenta e dois anos de idade e eu pensei: “vou tentar fazer uma poesia com quarenta e duas palavras, daí eu percebi que as palavras com “s” são mais fáceis da gente conseguir um fluxo, uma leitura em fluxo coerente, discernível, compreensível. E o grande desafio é que a poesia, ao se ler, faça sentido, desde o primeiro “s” até o último.

 

19. Você se sente realizada, frustrada ou está parcialmente satisfeita sendo uma escritora?

Cláudia: Eu me sinto parcialmente realizada. Estou realizada porque tem trabalho meu publicado; se amanhã eu vier a falecer, no meu computador está lá o terceiro livro, com título e tudo mais. Então nesse sentido eu estou bastante satisfeita. A questão é: espaço para a gente conversar sobre poesia, espaço para a gente declamar poesia, espaço para a gente vender as nossas obras. Ainda está faltando muito para que eu me sinta realizada. Mas, talvez, o que esteja faltando para mim tenha mais a ver com auto estima, vaidade e questões financeiras. Eu até devesse olhar para essa questão de uma forma mais literária e não comercial, não sei. Mas sendo bastante sincera, eu me sinto parcialmente realizada hoje.

 

20. As palavras a seguir são suas: “escrevo para proclamar um desejo. Escrevo para dar vazão a uma inquietude interna. Pelo visto, os motivos que te levam a escrever são vários... Quais os mais recorrentes?

Cláudia: O desejo que eu falo ali era o desejo de me posicionar afetivamente, reclamar uma paixão escondida – reclamar no sentido de manifestar. Escrevo para dar vasão a uma inquietude interna. Não é só uma inquietude, nós temos muitas, principalmente quando tem uma segunda pessoa envolvida. Então eu diria que os motivos mais recorrentes que impulsionam a minha escrita seriam o equilíbrio afetivo e amoroso entre duas pessoas, assim como, de que forma manter esse equilíbrio no decorrer dos meses, dos anos, das décadas. De que forma você faz parte do casal, tentando preservar a tua individualidade enquanto pessoa. Como é que a gente elabora esta equação, como a gente coloca em prática esta equação. Isso é possível ou isso é utópico? Mas as inquietudes são mais nesse sentido afetivo, sem dúvida.

 

21. “É tão difícil as pessoas razoáveis se tornarem poetas, quanto os poetas se tornarem razoáveis”, Essa frase é de Pablo Neruda; você, por ser uma poetisa, é uma pessoa que não é razoável? Justifique...

Cláudia: Eu não sei qual foi o intuito que o Pablo Neruda utilizou a palavra razoável, nem de que forma foi feita esta tradução. Mas, ao ler, eu imagino que o razoável que ele esteja se referindo seja no sentido de mediano, normal, razoável no sentido ne normal. Pessoas normais, na minha leitura, dificilmente se tornam poetas e os poetas jamais serão pessoas normais. Porque o olhar é diferente, a sensibilidade é diferente, a compreensão e o entendimento das coisas que estão ao nosso redor é diferente. Não que nós estejamos em algum pedestal literário ou cognitivo, de inteligência... De forma alguma, não é isso. A lente que enxerga as coisas, o mundo, é diferente. Nesse sentido nós jamais seremos normais, razoáveis. Nós estamos fora da curva. E respondendo a pergunta, eu não sou uma pessoa normal, não sou uma pessoa mediana. De novo, não é no sentido de se autoproclamar, de se auto-vangloriar, de forma alguma. É em relação a lente, que pode estar no olho, que pode estar nas coisas que a gente ouve, pode estar na pele, na sensibilidade, pode estar na alma. A lente não é normal.

 

22. Há na literatura, um livro ou um poema que você gostaria de ter escrito? Se sim, qual seria?

Cláudia: Tem. É um poema maravilhoso. Acho que é do Carlos Drummond de Andrade. É inclusive, uma forma de escrita, metrada, que eu pretendo ainda produzir alguma coisa, nos moldes dessa estrutura.

 

23. Quando alguém te indica uma obra, autor ou autora que você não conhece, você procura informações sobre ele/ela, ou isso não te interessa?

Cláudia: Sempre que alguém me indica uma obra, um autor ou uma autora, o que vai definir se eu vou atrás, para pesquisar e depois adquirir a obra é, sem dúvida, a pessoa que está me indicando. Eu tenho inúmeros amigos poetas e dependendo de quem me indica, eu nem vou pesquisar. Agora, por outro lado, se é uma pessoa na qual eu tenho afinidade, em termos de gosto literário, aí sim. Pode ser que eu nem pesquise, pode ser que eu anote o título da obra, o nome do autor/autora e vá direto para a aquisição. Tem essas coisas que a gente precisa considerar.

 

24. Quem ou o que é que te inspira e te motiva a escrever? Onde você busca a sua fonte de inspiração?

Cláudia: As questões humanas são o que me inspiram e me motivam a escrever. Eu imagino que meu anjo da guarda é coautor da grande maioria das coisas que eu escrevo. Tem inspiração extra-física, sem dúvida. E eu acho que aquele momento em que a gente se recolhe em silêncio, de nós mesmos e que a gente analisa com bastante lucidez, aquilo que nos aconteceu e de forma mexeu conosco, de que forma a gente reagiu; como nos encontramos em função do que houve. A tentativa em explicar todas essas situações é o grande desafio da minha escrita.

 

25. Você já está preparando o próximo livro, ou ainda é cedo para pensar sobre isso?

Cláudia: Sim. Já tenho oitenta por cento do terceiro livro - que se chamará A Sala – pronto. A capa do livro será uma foto da sala da minha casa, que foi palco de muita – (Nossa Senhora) – de muita escrita. E ali na sala tem as coisas que eu te falei, tem silêncio, tem a televisão com aparelho de som conectado. Ali eu coloco as minhas músicas. É uma sala próxima da cozinha e eu consigo pegar minha cerveja, meu vinho, enquanto eu estou ouvindo música, no meu silêncio. Às vezes acendo uma velinha ou um incenso, às vezes não precisa...

 

 

 

 

 

CLÁUDIA FERRO KALAFATÁS

 


Nasceu em maio de 1966. Florianopolitana, é descendente de gregos e italianos. Concluiu mestrado em Administração e Gerência em 2008.

Escreve poemas desde 1991 e recebeu muita influência das obras de Ida Katzap, Neimar de Barros, Fernando Pessoa e Pablo Neruda. Atualmente lê André Ramos, Pablo Casals, Alice Ruiz e Cláudio Schuster, dentre vários outros.

A música em muito colaborou para a inspiração da poetisa. Assim, desde Genesis, Vangelis, Supertramp, passando por Fleetwood Mac, Eurythmics e Madredeus, até os mais recentes como Sarah Brightmann e The Corrs. As inspirações nacionais transitam entre Guilherme Arantes, Simone, RPM, passando por Zizi Possi, Oswaldo Montenegro, Renato Russo, Adriana Calcanhotto e Tribalistas.

Publicou seu primeiro livro em setembro de 2015 intitulado Dilemas, reticências: poemas. A segunda edição foi lançada em dezembro de 2015.

Co-editou Garimpo de palavras em 2007, Narrativas e Poéticas II em 2008, Elos & Anelos volume I em 2008, Microcosmos em 2009, Literatum & Poeticum volume II em 2009 e Labirintos e Palavras em 2010, todos através da Editora Guemanisse (RJ).

Em 2007 recebeu de seu poema intitulado 42 ésses, menção honrosa no Concurso de Contos e Poesia Guemanisse (RJ).

Em novembro de 2018 lançou seu segundo livro intitulado Harpa Inerte.

Em 2018 foi convidada a integrar a Antologia Poetas da Ilha, lançada em novembro daquele ano.

A autora é membro da Confraria do Pessoas, nome alusivo aos inúmeros heterônimos de Fernando Pessoa.

Em março de 2019 publicou poemas na revista eletrônica Escritores do Brasil.

Atualmente vem publicando poemas na revista literária eletrônica, de triagem trimestral, chamada A Ilha.

Sua terceira obra poética, provisoriamente intitulada A Sala, encontra-se em fase de criação. A autora pretende publicá-la em 2020.

CASA DA LITERATURA CATARINENSE

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