terça-feira, 23 de novembro de 2021

FEIRA DO LIVRO INDEPEDENTE DE PORTO ALEGRE

 Escrita independente ganha espaço nas ruas de Porto Alegre

Feira foi viabilizada com apoio de autores através de recursos exclusivamente colaborativos


POR JÉSSICA MENDES

O clima agradável do domingo, 17/5, proporcionou o cenário perfeito para a 1ª Feira do Livro Independente de Porto Alegre, que levou centenas de pessoas à Rua João Telles, no bairro Bom Fim, em Porto Alegre (RS). O evento reuniu mais de 80 autores independentes em um espaço preparado para a troca de ideias, exposição e venda direta das obras. Entre os expositores estavam escritores e ilustradores locais.

De acordo com o escritor e organizador do evento, Gabriel Cianeto, a feira surgiu a partir de uma necessidade de ter um espaço no qual pudesse expor suas obras para o público leitor. Por não ser um escritor muito conhecido, achava difícil chegar ao público, apesar de receber um bom retorno nas oportunidades de exposição. “Percebi que faltava essa ligação, essa possibilidade de encontro entre autor e público. Imaginei que houvesse vários outros autores com a mesma necessidade. Foi aí que surgiu a ideia da Feira do Livro Independente”, explica.

Caracterizada totalmente pela iniciativa popular, a feira não recebeu aporte de nenhuma instituição pública ou privada, contando apenas com a colaboração espontânea dos inscritos. Para que o evento fosse projetado, Cianeto teve auxílio de uma equipe atuando na organização. Entre eles, um intérprete de Libras-Português, com o objetivo de levar mais acessibilidade ao evento. Por ter estudado Libras, o organizador diz que compreende a importância da presença do profissional como um fator de acessibilidade social. “Chamamos o intérprete para estar aqui disponível tanto para os autores quanto para os visitantes surdos.”

Inicialmente, a feira estava marcada para o dia 5 de maio, mas precisou ser cancelada devido ao tempo instável. Com isso, a inscrição também foi prorrogada, agregando mais autores para a exposição. O organizador esperava receber entre 20 e 30 adesões, mas foi surpreendido com 60 para a primeira data. “Quando resolvi abrir novamente as inscrições, muitos que não tinham visto a tempo puderam participar, ultrapassando a marca de 80 participantes”, recorda.


Divisão que integra


A Feira do Livro Independente aconteceu de forma simultânea com a já tradicional Tô na Ruaque ocorre no mesmo local. “Somente depois de marcar o evento vi que a Tô na Rua ia acontecer também. Então, fiz contato com a organização do evento e vimos como solução unir o público das duas, como forma de somar”, afirma Cianeto. A junção foi bem vista pelos participantes. Julia Gonçalves, 24 anos, chegou no local para a Tô na Rua, mas se surpreendeu quando viu a Feira. “Foi uma grata surpresa. Gosto muito da leitura e conhecer novos autores é sempre bom”, diz.

Mas não foram só os visitantes que se alegraram com a integração das feiras. O escritor Mário Augusto Pool, autor de sete publicações, esteve presente expondo suas obras, como a mais recente, No Nevoeiro, de 2018. Para ele, mais importante do que capitalizar o livro, é divulgá-lo. “É uma das melhores experiências que já participei, não só em grupo como individual, porque ela tem essa capacidade de prospectar novos leitores. Além disso, é incrível a capacidade de divulgação”, comenta.

Mario dividiu a banca com mais quatro autores que conheceu através de um curso de formação de escritores. Gilberto Fonseca, Felipe Nunes, Adriana Maschmann e Maurício Schames expõem, realizam eventos e buscam a divulgação de suas obras em conjunto. Também novo no mundo literário, Gilberto Fonseca apresentou sua estreia na literatura juvenil, com o livro A Casa no Fim da Rua. Ele elogiou a criação da Feira. “A iniciativa é extremamente interessante e está um clima super agradável. A junção com o Tô na Rua deu muito certo”, fala.

Jovens oportunidades

Mike Lorry, 19 anos, está no Brasil desde 2017. Desde que veio do Haiti, sua terra natal, empenhou-se em aprender a língua portuguesa para poder conversar com o público através das palavras. Na companhia do irmão Joseph, de 14 anos, ele integrou a Feira do Livro Independente com seus três zines, que falam sobre amor, felicidade e sobre sua vida. “É muito bom estar aqui. Vi o evento no Facebook e me inscrevi para participar. É minha primeira vez expondo”, comenta.

Apesar de estar no país há pouco tempo, Mike se esforça e já fala a língua sem dificuldade. Suas obras são escritas em português e inglês. A última publicada, chamada Inimigo em Comum, traz ainda a tradução para o crioulo, sua língua nativa.

A escritora juvenil Miriam Dohrn, uma das primeiras a realizar a inscrição para a feira, apresentou seu primeiro livro, intitulado Detektis. Ela traduz o que a feira representou para os expositores, em suma maioria independentes. “Foi uma importante oportunidade para os autores que não têm uma editora e nem um espaço em livrarias para expor suas obras direto para o público”, cita.

Com o sucesso da primeira experiência, Cianeto já projeta uma segunda edição. A ideia é realizar a feira anualmente. A pedido de alguns autores, será estudada a possibilidade de um evento semestral. “Todos os retornos que eu tenho recebido é de que estávamos precisando de um evento assim, de ter um espaço para escritores independentes”, finaliza.


https://medium.com/betaredacao/feira-do-livro-independente-reuniu-80-escritores-em-porto-alegre-8d300c0d4d55

segunda-feira, 22 de novembro de 2021

FINLÂNDIA, UM PAÍS AMIGO DA LEITURA


Os finlandeses amam livros. Cada cidadão compra 4 títulos e faz empréstimo de mais 12 na biblioteca, ano após ano.

A literatura sempre esteve no coração dos finlandeses, e talvez hoje esteja mais presente do que nunca. Mais de 20 milhões de livros são vendidos na Finlândia a cada ano, o que representa uma média de 4 livros por pessoa, incluindo o público infantil.

Na Finlândia, assim como em qualquer outro lugar, os leitores são claramente divididos em: compradores assíduos de livros e outros. Aproximadamente um em cada seis finlandeses com idade entre 15 e 79 compra pelo menos 10 livros por ano. Juntos, esses compradores assíduos adquirem mais de metade de todos os livros vendidos. Em geral, a aquisição de livros é algo bastante comum: três entre quatro finlandeses compram pelo menos um por ano.

O advento da internet não parece ter afetado a popularidade dos livros em uma grande escala. Por exemplo, em 1995 (antes do uso da internet se tornar global), uma quantidade ainda menor de livros eram comprados na Finlândia comparada à realidade de hoje. Portanto, a popularidade dos livros aumentou mesmo com as grandes proporções tomadas pela mídia eletrônica. E não é só isso: os preços dos livros aumentaram em uma proporção maior do que seus volumes. Os leitores estão dispostos a pagar mais por seus livros.

Os livros de ficção finlandesa permanecem no topo da lista de mais populares no país, apesar de obras do mesmo gênero traduzidas de outros idiomas venderem muito bem também (mesmo após registrar uma ligeira queda nos últimos tempos). Aproximadamente um em cada três finlandeses leu algum livro de ficção nacional no ano passado. Outros livros bastante adquiridos são os de história, economia doméstica (livros de culinária em especial), memórias, crime e infantis. Os leitores do país estão lendo cada vez mais traduções de livros de ficção escritos em outras línguas.

Os livros se tornaram um presente bastante tradicional na Finlândia. Porém, este cenário está mudando bastante, pois as pessoas estão comprando cada vez mais livros para si mesmas. Aproximadamente metade dos livros comprados como presentes são destinados a membros da família (e provavelmente serão lidos no futuro por quem os comprou).

A terra das bibliotecas

A Finlândia é um país repleto de bibliotecas, há pelo menos uma por município. As mais de 300 bibliotecas centrais do país têm 500 filiais, especialmente em áreas esparsamente populadas. Também há bibliotecas móveis (em forma de ônibus especialmente equipados). As bibliotecas móveis realizam apenas 10% dos empréstimos em todo o país. A Finlândia tem até mesmo um barco-biblioteca. Incrível, não? Um sistema de reserva permite que bibliotecas móveis ofereçam os mesmos livros que as bibliotecas centrais.

A moderna biblioteca móvel abriga uma seleção de aproximadamente 4000 títulos, que vão de livros a revistas, jornais e material audiovisual. Os itinerários das bibliotecas móveis contêm dezenas de pontos. Mesmo em uma região com população relativamente densa, como a do norte do país, uma biblioteca móvel pode registrar até 50.000 quilômetros percorridos por ano (no norte, as distâncias são maiores).

Tendo como base os padrões europeus, os serviços prestados pelas bibliotecas públicas finlandesas são tecnologicamente avançados e substanciais em termos de volume. As bibliotecas são gratuitas, e cobram apenas pequenas multas para atrasos na entrega.

Seus serviços são extremamente populares e elas são usadas com bastante frequência (aproximadamente 40% dos cidadãos são usuários assíduos e visitam a biblioteca pelo menos duas vezes ao mês). Em média, os finlandeses fazem empréstimos de livros mais de uma vez em um prazo de 30 dias. Ainda, analisando o caso por outra perspectiva, as bibliotecas contêm pouco mais de 7 livros por pessoa, e cada livro é lido em média duas vezes e meia por ano.

Bibliotecas também adquirem grandes quantidades de livros. A cada ano, elas investem mais de 300 euros por cidadão na aquisição de livros e outros materiais. As bibliotecas também beneficiam escritores: autores e tradutores podem se candidatar para receber uma bolsa de financiamento para a produção de suas obras. Essas bolsas também são dadas como prêmio para autores que não podem trabalhar por causa de restrições impostas pela idade ou doenças.

Apesar dos livros serem o item em maior proporção nas coleções de bibliotecas públicas, há muitas outras coisas à disposição dos frequentadores: revistas, jornais e material audiovisual.

Rede de bibliotecas na Finlândia

  • Mais de 300 bibliotecas centrais
  • Mais de 500 filiais de bibliotecas
  • Mais de 150 bibliotecas móveis
  • Mais de 12.500 pontos de parada da biblioteca móvel
  • Um barco-biblioteca

https://finland.fi/pt/vida-amp-sociedade/finlandia-um-pais-amigo-da-leitura/



REPORTAGEM SOBRE LANÇAMENTO DE LIVROS

 Uma reportagem interessante sobre lançamento de livros


https://www.youtube.com/watch?v=OeQXfItbDAI

ESCRITORES CATARINENSES GANHAM ESPAÇO COM AUMENTO DA LEITURA NO DISTANCIAMENTO

 Uma das boas interferências da pandemia na rotina está no aumento da procura por livros, em diferentes formatos, estimulando a produção de quem acredita que é possível e procura sobreviver da arte.

A pandemia de Covid-19 interferiu na rotina de todo mundo, mas há quem garanta que a leitura aumentou significativamente nesses dez meses de distanciamento social. Se livrarias fecharam as portas e editoras foram à falência, mais livros chegaram pelos Correios e foram buscados no formato e-book. Assim, é possível especular sobre a situação dos catarinenses que escrevem, como vêm sobrevivendo, editando e distribuindo sua produção.

Há gente que não se rendeu e continua criando, e também os que se recriaram como artistas e buscaram formas alternativas de chegar ao público. “Embora não pareça, a produção literária aqui é intensa, principalmente de jovens autores”, afirma Alcides Buss, poeta e sócio, com a mulher, Denise, da editora Caminho de Dentro, em Florianópolis.

Uma análise da literatura feita em Santa Catarina passa pelo que produzem os nomes da chamada velha geração, consagrados – e presos aos sistemas convencionais de publicação, que envolvem editoras comerciais, e os novíssimos talentos que estão emergindo.

O contista Flávio José Cardozo acabou de ver relançado o livro “Singradura” (EdUFSC), em edição comemorativa aos 50 anos da primeira impressão. O mesmo não se pode dizer de Silveira de Souza, Miro Morais, Rodrigo de Haro, Péricles Prade e Fábio Brüggemann, cujas obras estão na gaveta, esperando por novas oportunidades.

“Eles fazem muita falta, mas que eu saiba continuam produzindo, porque escritor de verdade não para de criar”, diz Alcides Buss. Entre as exceções estão Cristóvão Tezza e Carlos Henrique Schroeder, com caminhos já consolidados.

No outro extremo estão novatos – e aí a lista é diversificada, vasta e espalhada pelo Estado inteiro. Ela é feita de gente que mora na Capital, mas também em Joinville, Blumenau, Jaraguá do Sul, Chapecó, Curitibanos, Lages, Concórdia, Laguna, Garuva, Santa Cecília e Guabiruba, para citar algumas das cidades onde escritores da nova geração produzem e fazem chegar, cada um à sua maneira, romances, contos e poesias a leitores sempre dispostos a desfrutá-los.

E há bons autores de diferentes idades que produzem “em” Santa Catarina, como os forasteiros Josely Vianna Baptista, Rodrigo Garcia Lopes e Sérgio Medeiros. “A literatura feita em Santa Catarina é muito ampla e diversa e não está restrita à Capital”, reforça Marco Vasques, ele também poeta, editor e crítico de teatro.

Para a jornalista Néri Pedroso, a descentralização é uma boa notícia, porque confronta a “postura colonizadora” de Florianópolis em relação ao chamado mosaico cultural catarinense, que contém “injustas invisibilidades”.

Entre os mais novos, observa-se várias mulheres que “surpreendem pelo domínio de linguagem e pela ousadia criativa”, nas palavras de Alcides Buss. Há pouco, para coroar o fim de 2020, o escritor Oldemar Olsen, de vasta produção e morador de Rio Negrinho, venceu pela segunda vez o Concurso Literário Cidade de Manaus “Prêmio Péricles Moraes”, no gênero crônica.

Autor respeitado e observador atento do cenário artístico catarinense, o blumenauense Dennis Radünz destaca nomes cujas premiações conferem ressonância a trabalhos de qualidade, seja de veteranos, seja de novatos. “A literatura em Santa Catarina teve na última década uma renovação intensa na prosa, de Carlos Henrique Schroeder e seu livro de contos ‘As certezas e as palavras’ (Editora da Casa), prêmio da Biblioteca Nacional em 2010, até Marcelo Labes e o romance ‘Paraízo-Paraguay’ (editora Caiaponte), Prêmio São Paulo de Literatura, em 2020, na categoria autor estreante”, informa. “Esta foi a década da prosa, inclusive com o extinto Festival Nacional do Conto sendo realizado em Florianópolis”, completa.

“Há uma literatura que se situa no embate, na resistência, em ressignificações históricas, no embaralho de temporalidades, na fluidez entre ficção e realidade.”

Néri Pedroso, jornalista e crítica de arte

Para onde quer que se olhe, existem autores produzindo. Néri, profissional de exitosa carreira no jornalismo cultural e crítica de arte, também cita o romance “Paraízo-Paraguay”, de Marcelo Labes, e ressalta que a moderna literatura catarinense se debate com questões de gênero e de justiça social, porque o Estado pede reflexões sobre o patriarcado, o machismo, a feminilidade e a própria inclusão do público LGBTQ+ na cena literária.

No campo institucional, a Academia Catarinense de Letras, já centenária, edita uma revista periódica e premia anualmente os melhores livros de contos, crônicas, poesias, romance e ensaio, incentivando autores de diferentes faixas etárias a escrever e publicar suas obras.

A vez das editoras caseiras e livros digitais

Se as editoras se fecham para novos autores, cabe a cada um descobrir e adotar estratégias para chegar ao leitor. “Surgem revistas e editoras on-line quase todos os dias”, constata o escritor Marco Vasques. A internet é um desaguadouro importante, mas carece do filtro regulador que prime pela qualidade.

Para Vasques, a educação é o caminho para apresentar aos jovens não só a literatura, mas o teatro e a dança, tornando-os, mais adiante, adultos preparados para conviver com a arte. Num país onde falta o básico para milhões de pessoas, tirar da arte e da cultura a condição de luxo, de supérfluo, é um desafio permanente.

“É importante mencionar o surgimento de novas editoras, muitas caseiras, meio artesanais, o que de certa forma fortalece a cena literária, mas não elimina as enormes dificuldades enfrentadas pelos autores”, afirma Néri Pedroso. Num Estado dominado pela ética ferrenha do trabalho, artistas de todas as áreas enfrentam a negação generalizada de que criar é um trabalho digno, passível de remuneração e aplauso.

A falta de políticas públicas para a área da cultura fecha um quadro de desconsideração que, hoje, chega a olhar com desconfiança quem escreve, atua, dança, pinta, canta ou toca um instrumento.

Neste cenário, o livro digital veio para ficar. “No futuro, talvez só ele sobreviva”, conforma-se o poeta Alcides Buss. Ele cita o escritor Milton Maciel, da Academia Joinvilense de Letras, que edita a revista “Escrever”, dedicada à formação de novos autores, e que é um entusiasta dessa opção de disseminação da leitura. Orgulhoso da iniciativa, Maciel destaque que ela é a primeira e única iniciativa do gênero no Brasil, a circular nas versões impressa e digital.

Diz Buss: “Eu próprio me beneficiei dela. Meus dois últimos livros de poesia, ‘Janela para o mar’ e ‘Viver não é tudo’, tiveram novas edições em formato e-book. Posso dizer que ganharam vida nova. Quando bem feitas, as edições permitem uma leitura fluente e agradável, até mesmo no smartphone, de menor custo para o editor e mais acessíveis para o leitor”.

Menos otimista que os colegas, o escritor e editor Fábio Brüggemann vê o fechamento de livrarias e editoras como um reflexo que vai além da pandemia.

A falta de políticas públicas para a área da cultura fecha um quadro de desconsideração que, hoje, chega a olhar com desconfiança quem escreve, atua, dança, pinta, canta ou toca um instrumento.

Neste cenário, o livro digital veio para ficar. “No futuro, talvez só ele sobreviva”, conforma-se o poeta Alcides Buss. Ele cita o escritor Milton Maciel, da Academia Joinvilense de Letras, que edita a revista “Escrever”, dedicada à formação de novos autores, e que é um entusiasta dessa opção de disseminação da leitura. Orgulhoso da iniciativa, Maciel destaque que ela é a primeira e única iniciativa do gênero no Brasil, a circular nas versões impressa e digital.

Diz Buss: “Eu próprio me beneficiei dela. Meus dois últimos livros de poesia, ‘Janela para o mar’ e ‘Viver não é tudo’, tiveram novas edições em formato e-book. Posso dizer que ganharam vida nova. Quando bem feitas, as edições permitem uma leitura fluente e agradável, até mesmo no smartphone, de menor custo para o editor e mais acessíveis para o leitor”.

Menos otimista que os colegas, o escritor e editor Fábio Brüggemann vê o fechamento de livrarias e editoras como um reflexo que vai além da pandemia.

“É o desprezo que as novas gerações têm pelo livro, apesar de que leem o tempo todo nas redes sociais, uma leitura tola, na maior parte.”

Fábio Brüggemann, escritor e editor

Ele desafia dizendo que gostaria de saber “quem encararia um novo Proust hoje em dia, dessa galera do Instagram ou do Facebook”. Para muitos jovens, ficar “parado” lendo um livro é perda de tempo, porque vai muito além dos 140 caracteres das mensagens do Twitter. “Eu mesmo lia muito mais livros há 15 anos, e sinto que perco um tempo enorme lendo m… nessas redes”, constata.

Nomes que romperam fronteiras

“Prosadores e poetas catarinenses jovens começaram a circular nacionalmente com mais frequência, o que antes estava reservado a nomes como Salim Miguel”, diz Dennis Radünz, citando nomes como Carlos Henrique Schroeder, Marcelo Labes e Cristiano Moreira. No ambiente doméstico, se perdeu o belo projeto de biblioteca comunitária Barca dos Livros, mas Florianópolis ganhou com as revistas (impressas ou eletrônicas) Gulliver e Texturas, entre outras.

“A ousadia e a qualidade estão nessas iniciativas de renovação e é fato que a área de literatura da Universidade Federal de Santa Catarina, a partir do PET Letras ou de professoras como Eleonora Frenkel e Telma Scherer, tem acolhido experimentos literários e trabalhos de graduação em escrita Ccriativa”, afirma Radünz.

Durante a pandemia, o fim dos eventos de literatura e a queda brusca de vendas nas livrarias locais foram os impactos mais sentidos. Em contrapartida, destaca Radünz, “a oferta de cursos literários breves em meio digital parece ter se firmado no imaginário, porque pessoas de todas as regiões e de outros países compartilham a mesma sala virtual com uma escritora ou escritor notório e antes inacessível”.

“A pandemia talvez tenha nos feito reencontrar o tempo interior, o tempo de ler textos densos, como um ‘Torto arado’, romance de Itamar Vieira Júnior que retrata o multiverso que é o Brasil.”

Dennis Radünz, escritor


https://ndmais.com.br/cultura/escritores-catarinenses-ganham-espaco-com-aumento-da-leitura-no-distanciamento/ 


quarta-feira, 10 de novembro de 2021

ENTREVISTA COM SAULO ADAMI

 






São mais de 100 livros publicados numa carreira que começou cedo, em passos trilhados e fortalecidos com o próprio jornalista, mas que começaram aos 9 anos de idade. Precisamente 123 livros publicados como autor em diversas áreas de literatura: poesia, conto, crônica, novela, romance, além de biografia, ensaio e história. Saulo Adami ainda dirige a própria editora, Estrada de Papel, criada ano passado para publicar ou reeditar livros de sua autoria e outros escritos em parceria.
Aos 55 anos, o brusquense que vive em Curitiba desde 2011 conta que não lembra de ter “vivido um período sem entusiasmo pela escrita ou sem inspiração”. E a quarentena que todos vivemos, não foi tão atípica pro veterano da literatura. Dedicou os dias de confinamento a finalizar alguns livros que estavam em andamento, como o “Cancionata: a revolta dos colonos e o martírio de Leopoldo Adami em Nova Trento”, que conta a história do seu trisavô que veio da Itália em 1875. Livro que, a propósito, o garante “reescrever a história de Nova Trento”.
Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, pisciano por completo e uma pessoa com tanto conteúdo que essa entrevista poderia render diversos desdobramentos, mas escolhemos seguir por seus lançamentos do semestre: os mais recentes livros “Cancionata” e “Boiteuxburgo: a cidade que um país esqueceu”.

A.G.: Já Boiteuxburgo: a cidade que um país esqueceu não é tão distante nem geograficamente. A história é de uma comunidade em Major Gercino que vem de encontro a uma série de conflitos, crises políticas, e falhas na gestão de dinheiro público. O que Boiteuxburgo tem de semelhança com a atual realidade do Brasil?
S.A.: O livro começou a ser escrito em 2003, quando visitei o antigo Núcleo Colonial Federal Senador Esteves Júnior, e para onde retornei em 2006 para entrevistar outros de seus moradores mais antigos, que tinham 80 anos de idade ou mais. O livro aguardou todo este tempo para ser publicado, e devo ao empresário e amigo Alcir Otto, que nasceu e cresceu em Boiteuxburgo, a oportunidade desta edição. Boiteuxburgo viveu o auge de seu desenvolvimento até final da década de 1950, quando entrou em declínio depois que representantes do governo Jânio Quadros fizeram uma visita à cidade do futuro, como era chamado o Núcleo, e constataram desvio de verbas, erros administrativos e outras irregularidades cometidas por servidores públicos federais. Desde então, o repasse de verbas governamentais deixou de ser efetuado à comunidade que teve mais de 4 mil habitantes na década de 1920. Estas e outras histórias são narradas pelos entrevistados e serão mostradas em um documentário que escrevi para a Prime Filmes. Como se pode constatar, a antiga história de Boiteuxburgo tem muitas semelhanças com a atual realidade do Brasil, país onde a corrupção e o abuso de poder têm se tornado cada vez mais presentes no trato da verba pública. Para nossa vergonha e infelicidade.

André Groh: Como funciona o processo criativo de escritor?
Saulo Adami: Acredito que cada autor tem seu modus operandi. O meu é simples: não tenho rituais, simplesmente escrevo. Costumo dizer que nasci escritor, por isso escrevo sobre qualquer assunto, com ou sem inspiração, em função da experiência com as escritas literária e jornalística. Comecei a escrever crônicas e contos aos nove anos de idade e peças teatrais aos 10, e sempre que a professora da escola primária perguntava o que eu queria ser quando crescesse, eu respondia que queria ser escritor. Aos 17 anos, lancei meu primeiro livro (“Cicatrizes”, 1982), com poesia, conto e crônica. Aprimorei minha escrita na prática diária do jornalismo: fui repórter e editor de jornais e revistas por mais de 20 anos, incluindo assessoria de comunicação social. Estas experiências me deram velocidade para escrever, e com o grande interesse que sempre tive pela pesquisa, ao deixar a redação de jornais passei a me dedicar a escrever livros sob encomenda – sobre personalidades, municípios, empresas e famílias. Ao mesmo tempo, me dediquei aos projetos pessoais ligados à literatura, ensaio e história. Hoje, tenho 123 livros publicados como autor nas áreas de literatura (poesia, conto, crônica, novela e romance), biografia, ensaio e história, e dirijo minha editora Estrada de Papel, criada em 2019 para publicar ou reeditar livros de minha autoria e outros escritos em parceria. Desde então, já foram lançados três livros com este selo editorial, e outros estão em preparo para publicação. Não lembro de ter vivido um período sem entusiasmo pela escrita ou sem inspiração. Nem mesmo quando escapei ileso de um assalto, em 2011, quando dois homens armados invadiram minha casa em Porto Belo, me amordaçaram e amarraram, levando meu carro, notebook – com quatro livros em fase de conclusão –, câmeras fotográfica e de vídeo. Desde então, passei a reeleger prioridades na minha vida.

A.G.: Na quarentena, dedicou-se a que?
S.A.: Ao que sempre fiz: escrever. Finalizei alguns livros que estavam em andamento, incluindo “Cancionata: a revolta dos colonos e o martírio de Leopoldo Adami em Nova Trento”, que conta a história do meu trisavô que veio da Itália para o Brasil em 1875. Poli textos antigos, escrevi artigos para revistas de história publicadas em Santa Catarina e no Paraná. Vivo profissionalmente da escrita, por isso trabalho simultaneamente em três ou quatro projetos, incluindo livros e roteiros para filmes documentários, uma atividade que também me realiza como autor. A quarentena, ao mesmo tempo que me privou de dar continuidade a projetos importantes, como documentários sobre a história de Santa Catarina e me fez parar de exibir o média metragem “O dirigível” (Griô Filmes, 2019), sobre as passagens do Graf Zeppelin e do Hindenburg pelo Sul do Brasil, na década de 1930, permitiu que me dedicasse mais intensamente a projetos pessoais de literatura que estavam adormecidos. A pandemia me deu oportunidade de me voltar um pouco mais para dentro de mim, reavaliando participação em alguns projetos nacionais e internacionais. E fazendo uma revisão da carreira, pois alguns ciclos na vida devem ser encerrados quando já não nos satisfazem. Tomei várias providências nesse sentido. E não tem problema a gente olhar para trás, de vez em quando, e mudar o rumo ou a direção. Isso faz um grande bem, é libertador!

A.G.: Você também é jornalista. O que mudou no jornalismo desde que deixou de atuar?
S.A.: Mudou muito desde que deixei a redação do jornalismo diário, e lá se vão 18 anos. Gostava de trabalhar como repórter e editor, e sinto saudades de alguns companheiros de ofício e de algumas das campanhas que fizemos e até mesmo das encrencas que enfrentamos no exercício da profissão. Mas, a roda do tempo girou, eu busquei outros caminhos na vida e na profissão, e perdi o entusiasmo que poderia ter me mantido ou me levado de volta às redações. Acompanho com tristeza o desaparecimento de vários jornais impressos ou de suas migrações para outras plataformas. O jornalismo contemporâneo já não me atrai. Não tem mais a magia que tinha quando comecei carreira, no início da década de 1980: a cidade era outra, tudo mudou de lá para cá. O que me deixa triste é ver que, apesar de todos os avanços tecnológicos e as facilidades do século 21, poucos veículos de comunicação conseguiram manter a qualidade na produção textual ou a profundidade na apuração da notícia. Então, acho que me afastei na hora certa. Sem arrependimentos.

A.G.: O que representam pra você o filme “O Planeta dos Macacos” (1968) e o livro “Homem não entende nada! Arquivos secretos do Planeta dos Macacos” (2015)?
S.A.: O filme de 1968, dirigido por Franklin J. Schaffner, é meu projeto de arqueologia cinematográfica vitalício. Só assisti ao filme uma única vez como fã, milhares de outras vezes o assisti como pesquisador. Este filme e seus derivados – quatro sequências (1970-1973), duas séries de TV (1974-1975), histórias em quadrinhos, roteiros romanceados e os novos filmes (2001, 2014-2017) são minha vida de escritor e pesquisador. O meu foco de interesse foi e continua sendo o fazer cinematográfico, as histórias de bastidores (making of) e os roteiros inéditos, o que me levou a escrever oito livros sobre o assunto (1996-2020). Para publicar o primeiro (“O único humano bom é aquele que está morto!”, 1996), vendi um terreno que recebi de herança dos meus pais, publiquei a obra em São Paulo, lancei em Brusque e fiz com que chegasse às mãos de fãs e estudiosos destas séries em 23 países, assim como às caixas de correspondências de atores, atrizes e técnicos que participaram destas produções. Entre estes profissionais, estão três ganhadores do Oscar: o ator Charlton Heston (Taylor), a atriz Kim Hunter (Dra. Zira) e o desenhista da maquiagem, John Chambers. Na trilha desta obra, vieram as outras sete, incluindo “Homem não entende nada! Arquivos secretos do Planeta dos Macacos” (2015), o mais completo sobre o tema até aqui, que reuniu os conteúdos dos livros anteriores. O mais recente, “Planeta dos Macacos: humanos devem morrer!” (2020) conta a história da série de TV de 1974. Mas, este assunto ainda vai render novos livros, e é um tema que tem me dado muitas alegrias. A maior delas foi vencer o primeiro Prêmio Odisseia de Literatura Fantástica, de Porto Alegre, com o conto “A Invasão dos Macacos”, escrito em 1997 e publicado no livro homônimo que lancei em 2018 quando foram comemorados 50 anos do lançamento do primeiro filme. Meus estudos também me levaram a fazer viagens de pesquisas aos Estados Unidos (1998-1999), a criar um fã clube postal (1984), editar um fãzine (1985-2000) e produzir documentários curta-metragem sobre o assunto. É, eu tenho gostado de fazer todas essas “humanices”, e meu trabalho ainda não está completo.

A.G.: Cancionata é uma provocação que reescreve a história de Nova Trento. Como surgiu essa pesquisa?
S.A.: Para mim, pesquisar é responder perguntas. Este livro nasceu de uma inquietação, em fevereiro de 2019. Professor de libras, Adriano Gripa me fez relembrar a história de meu trisavô, o imigrante tirolês de Calliano de Trento, Leopoldo Giuseppe Adami, e de sua morte (1884) no Distrito Colonial Nova Trento. Uma pergunta surgiu: “Leopoldo Adami foi assassinado?” Foi o que me levou a pesquisar um tema que me atraía desde 1978, quando fiz as primeiras anotações para um futuro livro. Compromissos profissionais e pessoais me fizeram deixar para mais tarde a conclusão das pesquisas, até que publiquei um artigo na revista “Blumenau em Cadernos”, em maio de 2019, ainda pleno de dúvidas. Até concluir a pesquisa, em fevereiro do ano passado, contei com apoios importantes, como o professor Juliano Martins Mazzola, historiador amigo de Nova Trento que inclusive traduziu alguns documentos originais. O companheiro de viagem mais frequente foi meu pai, Luís Avaní Adami: bisneto de Leopoldo Giuseppe Adami, neto de Domenico Leopoldo Adami e filho de Luís Domingos Adami. Consultamos acervos públicos e privados em Itajaí, Brusque, Nova Trento e São Leopoldo (RS). Durante nossas breves expedições, conversamos e conhecemos um pouco mais a nós mesmos e às pessoas que nos foram apresentadas pelas evidências, fizemos reuniões familiares para falar sobre um passado comum a todos. Escrever este livro foi, também uma oportunidade de publicar histórias inéditas de Nova Trento, como a revolta dos colonos (1878) e o processo que Leopoldo Adami moveu contra o agrimensor norte-americano Edward Gross, que o torturou quando foi reclamar seus direitos na sede da administração do Distrito Colonial Nova Trento, subordinado a Brusque. O processo (1878-1880) foi localizado no Arquivo Histórico de Itajaí e esperou mais de 140 anos para ser revelado. As pesquisas me levaram, também, a fazer uma revisão completa das origens de Nova Trento desde antes da grande imigração (1875) que estimulou meus antepassados a partir de sua Itália natal para vir morar na floresta brasileira. O livro foi lançado com apoio da Associação Beneficente Besenello e da Estoparia Catarinense, e em Nova Trento parte de sua venda é revertida em benefício da Rede Feminina de Combate ao Câncer. 

ENTREVISTA COM O ESCRITOR SAULO ADAMI


Como escreve Saulo Adami

Saulo Adami é escritor e editor, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná.

1) Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
S.A.) Desde criança, acordo cedo, entre 5 e 6 horas da manhã. Comecei a escrever aos 9 anos de idade, e escrevo todos os dias. Lancei meu primeiro livro (“Cicatrizes”, 1982 – poesia, conto e crônica) aos 17 anos, hoje são mais de 100 livros publicados nas áreas de literatura, biografia e história. Antes do café da manhã, o computador já está ligado para responder e-mails, cumprimentar aniversariantes e ler apenas boas-novas, até começar a trabalhar nos textos do dia. Este “modus operandi” muda quando há maior urgência para entrega de livros para revisores ou editores.

2) Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
S.A.) Por 20 anos, trabalhei como jornalista, aprendi a escrever a qualquer hora do dia, devido à urgência da entrega das matérias e reportagens e devido às exigências dos editores. Não tenho rituais para escrever: ativo meus sentidos e começo.

3) Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
S.A.) Escrevo livros e roteiros para filmes. Então escrevo muito, todos os dias, por várias horas. Sem auxiliares ou assistentes, gerencio agenda de compromissos, participo de eventos no Instituto Histórico e Geográfico do Paraná – do qual faço parte desde 2017 e coordeno alguns de seus programas –, abasteço com informações as redes sociais e faço contato com amigos que atuam nos mais diversos segmentos profissionais. Tenho a sorte de ter amigos colaboradores e coautores. A meta diária é escrever e cumprir os prazos estabelecidos em contratos. Além disso, tenho prazos que estabeleço para meus próprios projetos, que nem por isso são menos cobrados.

4) Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
S.A.) A partir das primeiras anotações – no caso de literatura – ou a partir da primeira entrevista – no caso dos livros biográficos ou de História –, começo a escrever. Algumas obras são mais exigentes e desafiadoras – biografias são as minhas favoritas! – mas o importante é avançar no trabalho, todos os dias, é atender ao chamado da escrita. O que me irrita é trabalhar com colaboradores que não têm ritmo, pessoas lentas, preguiçosas e improdutivas. No mais, sigo meu trabalho em paz.

5) Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
S.A.) As travas estão em quem escreve. É preciso conhecer o assunto antes de começar a trabalhar porque pesquisar é responder perguntas. Só escrevo sobre o que acredito. Por isso, se o processo de escrita se torna lento demais, o problema está em mim. E a solução, também. O que mais me estimula a prosseguir com o trabalho, tanto em literatura quanto em outros temas, é ver o trabalho em constante evolução. Descarto expressões, parágrafos ou páginas inteiras sem hesitação, para o bem do andamento do processo de criação. Nunca escrevo um livro de cada vez, aprendi a escrever com ou sem inspiração na redação dos jornais. Não tenho medo de não corresponder às expectativas porque me entrego de corpo e alma ao que faço. Às vezes, projetos se alongam devido às suas complexidades.

6) Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
S.A.) Tantas quantas a complexidade do texto exigir. Sim, mostro meus trabalhos para outras pessoas, principalmente para minha mulher, a psicóloga Jeanine Wandratsch Adami que, além de coautora de algumas de minhas obras, acompanha meu dia a dia. Tenho estúdio em casa, mantenho a porta sempre aberta. Sou receptivo às avaliações e sugestões, teimoso quando necessário para o bem do livro em produção.

7) Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
S.A.) Deixei de lado a máquina de escrever 20 anos depois de começar a produzir literatura. Aderi ao computador em 1996. Sem dúvida, a tecnologia facilita em muito o meu trabalho, que requer organização, precisão e velocidade. Hoje, raramente escrevo à mão. Exceção para quando esboço as primeiras linhas ou páginas de poesia, conto, crônica, novela ou romance.

8) De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
S.A.) Fui criado entre contadores de histórias, personagens curiosos e divertidos que frequentavam o comércio de meus pais e que aguçaram minha imaginação. Dentre estes personagens estavam avós e primos, colegas da escola e um cachorro chamado Pió, parceiro de aventuras do avô materno, Serafim Conte. Na Escola Municipal Luiz Silvério Vieira, quando a professora perguntava sobre profissões, respondia com a confiança de que um dia o futuro seria o presente mais esperado: “Eu quero ser escritor!” Minha avó Ema Fornari Conte era benzedeira. Foi ela quem disse para minha mãe, assim que nasci, que eu seria escritor. Aos três anos de idade, escrevia com água, carvão e giz nas paredes da casa-venda de meus pais. Na escola, eu só queria aprender a ler e a escrever bem. Fugia dos cálculos e das ciências físicas e biológicas. Prioridades em minha vida sempre foram escrever e publicar. Passei a maior parte da adolescência estudando e escrevendo. Fui um guri normal, pleno de dúvidas mas ao mesmo tempo certo de que queria ser escritor. Eu mentalizava minhas experiências futuras: escrevendo, autografando, vendendo livros. Meus pais sempre fizeram tudo para me ajudar na realização dos meus sonhos. Mesmo aqueles que não condiziam com o futuro que almejassem para mim. Procurava ajudá-los no comércio e nas terras em que meu pai plantava. Eu fazia o que gostava: assistia “Vila Sésamo”, “Shazan-Xerife & Cia.” e “O Planeta dos Macacos” na TV. Tive sarampo, caxumba, catapora, joelhos ralados, espinho nos pés, calos e hematomas. Mas, sobrevivi, para contar estas e outras histórias. Quanto aos hábitos para manter a criatividade, procuro ler livros ou pelo menos trechos sobre os mais variados assuntos, assisto filmes e, principalmente, converso com outras pessoas – desde meus entrevistados aos amigos, que são infindáveis fontes de inspiração.

9) O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos?
S.A.) Continuo produzindo textos diferentes simultaneamente, mas hoje escrevo mais livros sob encomenda do que literatura. Estou mais ágil e muito mais seguro do que estou fazendo e consciente do ponto no qual quero chegar. Ao escrever uma história vinda da inspiração, em geral sei como será seu começo, seu meio e seu final, e trabalho entusiasticamente para preencher as lacunas entre uma fase e outra da história. Se o processo se torna lento, tento retomá-lo mais tarde. Mas, se ao tentar a retomada nada muda no avanço da criação, encerro as tentativas.

10) Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
S.A.) Até o momento, os projetos que gostaria de fazer já estão iniciados. Há muitos livros que gostaria de ler e que ainda não existem, principalmente sobre os temas que gosto, a exemplo da biografia de Arthur P. Jacobs (1922-1973), produtor da série cinematográfica “O Planeta dos Macacos” (1968-1973). Um dia, quem sabe…



sexta-feira, 5 de novembro de 2021

"O ISOLAMENTO TEM ME ENSINADO LIÇÕES" - IGNÁCIO LOYOLA BRANDÃO

 

Aos 84 anos, o membro da Academia Brasileira de Letras diz durante a Fliss que aprendeu a organizar a casa e está começando um novo romance



Aos 84 anos, o jornalista e romancista Ignácio de Loyola Brandão vive uma fase singular. Um período de descobertas. O isolamento decorrente da pandemia do coronavírus  tem ensinado lições importantes a esse mestre da literatura, membro da Academia Brasileira de Letras, especialmente do ponto de vista pessoal. “Agora sei onde ficam os lençóis, as fronhas, os pratos, as travessas, os temperos e os copos. Antes, eu era um estranho dentro da minha casa. Não sabia onde tinha um vaso para colocar flor. Agora eu sei”, confidenciou o escritor durante a Fliss, a Festa Literária Internacional de São Sebastião, que acontece até domingo de forma 100% online.

Diferentemente de muitos casais que falam em separação, esse paulista de Araraquara conta que a quarentena tem feito bem para o seu convívio com a mulher Márcia, arquiteta com quem está casado há 37 anos. “Estamos mais próximos. A coisa ficou mais leve e cordial”, contou.

Atualmente, é ele quem prepara o café da manhã e lava a louça, tarefa que faz em paralelo às horas de escrita. E lá se foram 10 páginas, o embrião de um possível futuro romance. Em fase inicial, a obra já ganhou até título provisório. A paixão pela escrita, recorda, é atribuída às professoras da infância. Uma delas, inclusive, disse uma frase em sala de aula que o pequeno Ignácio jamais viria a esquecer. “A fantasia ajuda a suportar a vida”, repete.

E é essa fantasia que tem levado o escritor a sobreviver à quarentena e a se deparar diariamente com um material riquíssimo advindo da pandemia. Amplo, diverso, mas também complexo, trágico e dolorido. “Eu ainda preciso trabalhar isso dentro de mim. É muito cedo, estou muito dentro ainda, tenho medo de fazer coisas erradas. Se eu sobreviver… Na minha idade, eu sei que o meu tempo é curto”, revela.

A morte não é um tabu para esse autor de tantas histórias. Preocupado? Não, Brandão não se preocupa com o tema. “No meu tempo eu me vou. Em 1996, eu descobri que tinha um aneurisma na artéria cerebral direita. Fui para o médico e descobri esse chamado assassino silencioso, que não apresenta sintomas. Trata-se de um derrame que te leva embora. Por um acaso, consegui descobrir fazendo exame para outra coisa, fiz a cirurgia e estou aqui.”

Hoje, Brandão prefere falar da vida à morte. Para ele, viver permite sentir gostos, ouvir sons, ver cores, ter paladar. “Adoro a vida!”, celebra.

Ele discorre sobre seu público. “Relação entre leitor e autor é curiosa. Você não sabe para quem escreve. Alguns você sabe, mas fora disso não tenho ideia de quem são os leitores, do que fazem. O que um leitor deve fazer dentro do livro. Se encontrar, eu sou esse personagem, eu tenho os mesmos desejos, sonhos, pensamentos, imaginários, loucuras, rejeições. Tudo que ponho no livro é tudo que eu ponho dentro de mim. As mesmas angústias, ansiedades. Quando o leitor não encontra isso, ele abandona o livro. Todo mundo já abandonou um livro e isso me dá muita culpa.”

Brandão segue o raciocínio. “Mas Jorge Luis Borges disse que parava com certos autores, porque o autor fracassou com ele. Então eu também paro. Não dirijo, não sei dirigir. E adoro quando vejo alguém está lendo um livro meu. Eu me aproximo, sento ao lado, às vezes a pessoa está riscando uma frase e eu vejo se aquela frase é a que eu escrevi, se é uma puta frase, uma frase linda. Tem frase que eu acho banal, que foi um clichê. Essa relação é muito misteriosa, você nunca sabe o que o leitor quer, precisa. Mas a literatura, a escrita te ilumina, te faz ver as coisas.” E termina expressando o desejo de todo escritor: “ Você precisa conquistar todos os leitores possíveis.”

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CASA DA LITERATURA CATARINENSE

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